TOTAL REPÚDIO AO
GOLPE DE 1964 - 50 ANOS! ABAIXO A DITADURA! BELO HORIZONTE, 10 DE
DEZEMBRO DE 2014 – DIA INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS
Aos 66 anos da
Declaração de Direitos Humanos (1948), o Brasil continua a ocupar a posição de
um dos maiores violadores de direitos humanos do mundo. O ano de 2014 marca o cinquentenário do golpe
que submeteu o país a 21 anos (1964- 1985) de ditadura sangrenta, referência
para todas as ditaduras instaladas no Cone Sul da América Latina durante as
décadas de 1960 e 1970. Estes 21 longos anos foram sucedidos por 29 anos de
transição conservadora, pactuada e sem ruptura, muito longe de qualquer
perspectiva de desenlace.
O continuísmo do
chamado Estado democrático de direito
– que se seguiu à ditadura militar - em relação a este processo é evidente. Seu
caráter de classe é o mesmíssimo da ditadura e da transição: o projeto burguês
de aceleração da acumulação capitalista/aumento exponencial da exploração e
opressão. Na prática, trata-se de um Estado de exceção permanente que se abate sobre
os trabalhadores e o povo. Este Estado foi urdido nas entranhas da
ditadura militar pelo mesmo bloco reacionário que a concebeu e concretizou, o
qual não se desfez: a burguesia associada ao capital multinacional e ao
imperialismo estadunidense, as Forças Armadas, os latifundiários, os donos do
aparato midiático, a Igreja Católica enquanto instituição, a ortodoxia cristã. Daí a manutenção de sua essência: a lógica da
Doutrina de Segurança Nacional, ou seja, o terror de Estado.
Os governos
constituídos a partir de 1985 reforçaram tal terror de Estado formatado pela
ditadura militar. Este parece estar agora definitivamente consolidado sob a
gerência do governo federal Dilma Rousseff (PT, PMDB, PCdoB), do governo
estadual de Minas Gerais Alberto Pinto Coelho/Anastasia/Aécio (PSDB), do
governo municipal de Belo Horizonte Márcio Lacerda (PSB) e dos demais governos
estaduais e municipais do país. Cinquenta anos depois do golpe militar – e mais
de dois anos depois da instalação da Comissão Nacional da Verdade – honra-se
ainda o pacto com os militares e os empresários O aparato repressivo se mantém
ativo; a questão dos mortos e desaparecidos não foi sequer equacionada; os
arquivos da repressão não foram abertos; a tortura, os assassinatos e
desaparecimentos políticos, adotados como política de Estado pela ditadura, permanecem como tal e continuam impunes.
Em maio de 2010, esta
impunidade foi institucionalizada: o Supremo Tribunal Federal confirmou a tese
dos militares ao decretar a blindagem daqueles que torturaram, estupraram,
mataram, esquartejaram e ocultaram cadáveres de presos políticos. Ficou
sacramentado que eles não são passiveis de punição. O Estado brasileiro, assim, anistiou crimes
contra a humanidade, os quais, por definição, são imprescritíveis, inafiançáveis
e inanistiáveis. No início de dezembro
de 2014, a
Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) da Organização dos Estados
Americanos notificou o Estado brasileiro pelo não cumprimento das determinações
a que foi condenado em sentença de 2010. A Corte IDH acusa o Brasil de “perpetuar
a impunidade”: as principais providências cobradas são a localização dos desaparecidos
e a retirada dos obstáculos à responsabilização penal dos torturadores e
assassinos de presos políticos – inclusive a Lei de Anistia. A cifra dos
torturados nos porões da ditadura passa dos 40 mil. Não sabemos o número real dos
mortos e desparecidos – certamente superior aos 435 nomes consolidados - uma
vez que os arquivos continuam fechados.
Além disso, não foram contabilizadas grande parte dos camponeses,
trabalhadores rurais e a totalidade dos indígenas chacinados aos milhares pelo
Estado e o latifúndio. A lista dos
torturadores nomeados por presos políticos
- a mais completa, mas ainda não exaustiva – contém 444 nomes. Trata-se de cadeia de comando. Assim sendo, todos
que dela participaram ou com ela colaboraram têm também que ser nomeados,
responsabilizados e punidos.
A cultura da
mentira organizada, garantia do silêncio sobre os crimes contra a humanidade
praticados pela ditadura, é elemento constitutivo também do Estado de exceção
permanente em vigor. Ocultaram-se os crimes da ditadura, ocultam-se os crimes
do tal Estado democrático de direito,
tão repressor quanto a ditadura que o engendrou. Está instalada uma guerra
generalizada contra os pobres. Esta promove a política de encarceramento em
massa – temos a quarta população carcerária mundial - e a banalização das
mortes nas masmorras em todo o território nacional. Promove-se igualmente o
genocídio sistêmico contra negros e negras, jovens, pobres e indígenas – estes
últimos em fase final de extermínio. O
infame dispositivo dos autos de
resistência seguidos de morte - que outorga aos policiais o direito de
matar- também é alçado a política de Estado.
Aqui, preconceito, discriminação,
machismo, homofobia, lesbofobia e transfobia são estruturais. O Brasil ocupa o
7º lugar no ranking mundial de
assassinatos de mulheres – a maioria das vítimas é composta de jovens
negras. Minas Gerais é o segundo estado
com maior número de violências contra a mulher. Há uma escalada do extermínio
da comunidade LGBT, também um dos maiores do mundo. A cultura hegemônica não
nega sua ancestralidade jesuíta, colonizada, patriarcal e escravocrata.
A Polícia Militar
brasileira matou, em cinco anos, 9 691 pessoas. É a polícia que mais mata,
entre todas as polícias do planeta. Em
2013, foram 2 212 mortos – 105 por mês, 6 por dia! O pedreiro Amarildo Souza, trucidado sob tortura na Unidade de Polícia
Pacificadora (UPP) da Rocinha-Rio de Janeiro, em julho de 2013, é um deles. Como
milhares de outros, continua desparecido! Nesta sociedade do desaparecimento, a tortura, as mortes e os
desaparecimentos forçados continuam institucionalizados. Ainda em julho de 2013, também no Rio, 15
moradores do Complexo da Maré foram executados pela PM. Rio de Janeiro e São Paulo têm as PMs mais
sanguinárias do Brasil. No Rio, as UPPs se efetivam como política de
Estado. Agora reforçadas pelas Forças
Armadas, consolidam o projeto higienista de extermínio através da chamada doutrina de pacificação, sucedânea da
Doutrina de Segurança Nacional. Em São Paulo, foram 10 152 mortes nos
últimos 19 anos – média de 45 por mês. A visibilidade destes assassinatos em
massa foi reforçada pela atuação do Movimento Mães de Maio a partir da denúncia dos crimes de maio de 2006. Em todo
o país, os massacres se sucedem em ritmo frenético. A título de exemplo mais recente: no dia 4 de
novembro deste ano, a população pobre e negra de Belém do Pará foi vítima de
mais uma chacina. Em sua sanha de vingança da morte de um policial militar miliciano
assassino, a Ronda Ostensiva Tática Metropolitana (ROTAM) atacou
indiscriminadamente comunidades de periferia e executou sumariamente pelo menos
20 pessoas. Em 2013, segundo dados
oficiais, 135 paraenses foram mortos por policiais.
A criminalização dos movimentos sociais é outro componente essencial
deste Estado de exceção permanente, que reprime selvagemente todas as formas de
luta dos trabalhadores e do povo: manifestações, greves, ocupações rurais e
urbanas, protestos estudantis. As grandes empreiteiras, colaboradoras fiéis da ditadura
militar, financiadoras do aparato repressivo – as mesmas responsáveis pelo
recente caso de corrupção multibilionária da Petrobrás, em conluio com o
governo federal e os partidos hegemônicos – têm sistematicamente militarizado seus
canteiros de obras transformando-os em campos de concentração especializados em
moer trabalhadores. Operários,
camponeses, trabalhadores rurais, dirigentes sindicais e comunidades indígenas
inteiras são monitorados, perseguidos, demitidos, indiciados, presos,
torturados, mortos e desaparecidos na luta contra as grandes obras das Parcerias
Públicoprivadas/PPPs, as hidrelétricas, o latifúndio e o agronegócio. O caso
mais recente é o de Cleomar
Rodrigues de Almeida, coordenador político da Liga dos Camponeses Pobres
(LCP) do Norte de Minas e Sul da Bahia, executado pelo latifúndio no dia
22/10/2014, em Pedra de Maria da Cruz-MG, tocaiado por pistoleiros a soldo dos
latifundiários da região.
Nas jornadas de junho de 2013 e
nas lutas anticopa de 2014, todo o aparato repressivo foi utilizado na
tentativa de aniquilação do movimento e dos manifestantes, considerados forças oponentes pelo Estado. O saldo é terrível: milhares de manifestantes
presos, espancados e torturados em todo em todo o Brasil. Em BH, todos os 37
presos no CERESP, no dia 7 de setembro de 2013, foram torturados e submetidos a
maus tratos. Dezenas foram indiciados -
só no Rio são 23, também espancados e torturados. Houve, pelo menos, três
dezenas de mortes. Em BH e região
metropolitana foram 4 : Douglas Henrique
de Oliveira e Souza, Luiz Felipe Aniceto de Almeida, Luís Estrela e Lucas
Daniel Alcântara Lima. É emblemático o fato de que o único caso
transitado em julgado é o de Rafael
Braga Vieira, jovem negro em situação de rua, catador de materiais recicláveis. Ele cumpre pena de 5 anos e 10 meses de
prisão no Complexo Penitenciário de Bangu/Rio de Janeiro por porte de explosivos – que eram, na
verdade, inofensivos materiais de limpeza. Ainda no Rio, nesta quarta-feira
(03/12/2014), no contexto de escalada da criminalização do movimento popular,
foi decretada prisão preventiva de três militantes: Elisa Quadros Pinto (Sininho), Karlayne Pinheiro e Igor Mendes da Silva. Este último foi preso e encaminhado para
o Complexo Penitenciário de Jericinó.
O agravante deste quadro é que a situação de barbárie à qual está
submetida a sociedade brasileira é fenômeno globalizado, constituindo-se em
núcleo duro do sistema capitalista. Ela
tem sido levada às máximas consequências pelo totalitarismo de mercado – verdadeiro
nome do neoliberalismo triunfante. Sua expressão exacerbada é o massacre dos 49 estudantes
da combativa Escola de Magistério de
Ayotzinapa/México - 6 mortos e 43 desaparecidos. Eles foram executados em
ação conjunta da polícia e do narcotráfico locais , a mando do então prefeito da cidade de Iguala (agora ex-prefeito preso), com a
conivência e a leniência do presidente Enrique Peña Nieto e dos
partidos hegemônicos (PRI, PAN,PRD). Se o terror do Estado burguês é global, a
solidariedade de classe e a luta contra a opressão burguesa são internacionais.
Manifestamos o mais veemente repúdio ao Estado mexicano! Prestamos incondicional solidariedade à luta
dos estudantes de Ayotzinapa! Vivos los llevaram, vivos los queremos!
O objetivo do nosso ato do dia 10 de dezembro de 2014 - Ato público em repúdio ao golpe de 1964 – 50 anos! Abaixo a ditadura! - é fechar este ano com o combate ao Estado de
exceção permanente e a reafirmação das nossas lutas contra ele. Abrimos nossas manifestações deste ano em 1º de
abril – dia do aniversário do golpe
- com a Manifestação em repúdio ao
golpe de 1964 – 50 anos! Abaixo a ditadura!. Ocupamos, então, o antigo
Viaduto Castelo Branco para um tributo aos mortos, desaparecidos, perseguidos,
presos e torturados pela ditadura e para a renomeação popular do viaduto. Ele passou a se chamar Viaduto Dona Helena Greco, referência combativa da luta contra a
ditadura e da luta pelos direitos humanos.
Reiteramos a nossa convicção de que somente a classe trabalhadora e o
movimento popular organizados são capazes de erradicar a situação de barbárie
vigente. A luta da Frente Independente pela Memória, Verdade e Justiça – FIMVJ/MG,
assim, é travada na perspectiva da luta de classes – com radicalidade, unidade,
horizontalidade, organicidade, autonomia e independência em relação aos
governos, ao Estado, aos patrões e à institucionalidade. A FIMVJ/MG se coloca como um movimento
antigovernista, anticapitalista e antinazifascista. Demarcamos também com os movimentos, partidos e organizações políticas reformistas que
firmam acordos com o aparato repressivo através de comissões conjuntas com a
polícia durante as manifestações. Ao mesmo
tempo, estes setores oportunistas e pelegos criminalizam e boicotam aqueles que
têm como questões de princípio a independência, o classismo, a radicalidade e a
combatividade. Participam da FIMVJ/MG,
presos políticos durante a ditadura, familiares de mortos e desaparecidos
políticos, coletivos, entidades, organizações, movimentos e indivíduos que
lutaram contra a ditadura e continuam a combater o aparato repressivo, o terror
de Estado e todas as formas de exploração e opressão.
NOSSAS LUTAS:
Pelo direito à Memória, à Verdade
e à Justiça!
- Nem perdão, nem esquecimento, nem
reconciliação: punição para os responsáveis por torturas, mortes e
desaparecimentos durante a ditadura militar e para aqueles que cometem estes
mesmos crimes contra a humanidade nos dias de hoje! Abaixo o terror de Estado e
do Capital!
- Pela abertura irrestrita dos arquivos da
repressão! Pela erradicação da
tortura e pelo desmantelamento do aparato repressivo!
- Pelo cumprimento da sentença da Corte
Interamericana de Direitos Humanos, que condenou o Brasil a punir os
responsáveis pelas mortes, torturas e desaparecimentos políticos ocorridos
durante a ditadura militar!
- Todo
apoio às iniciativas de construção de comissões independentes de memória,
verdade e justiça!
Abaixo a repressão! Pela
liberdade de protesto,
manifestação e expressão!
- Pelo fim da Lei de Segurança
Nacional! Pelo fim das leis repressivas! Pelo fim dos
processos e pelo trancamento de todas as ações penais contra manifestantes! Pela libertação imediata das
presas e dos presos políticos de 2013 e 2014! Pelo fim das prisões e
perseguições! Liberdade já para Rafael
Braga!
- Pela reintegração
imediata de todas as trabalhadoras e trabalhadores demitidos por fazerem greve!
- Pelo fim da criminalização
dos pobres! Pelo fim da criminalização da luta dos estudantes! Pelo fim da
criminalização da luta dos trabalhadores da cidade, do campo e do movimento
popular!
- Pelo fim das torturas e das execuções! Pelo
fim do genocídio dos jovens, negras e negros, indígenas e pobres!
- Pelo fim do extermínio da comunidade
LGBT! Pelo fim da violência contra as
mulheres! Abaixo o racismo, abaixo a LGTBfobia e abaixo o machismo!
- Abaixo as UPPs! Abaixo as invasões policiais e
militares dos morros, universidades, ocupações e favelas!
- Pelo fim do aparato repressivo! Pelo fim
imediato das Guardas Municipais, da Polícia Militar, da Polícia Civil e da
Força Nacional de Segurança Pública! Fora as Forças Armadas!
- Nenhum tipo de interlocução com o aparato
repressivo!
Pela luta independente, realizada pela classe
trabalhadora e pelo movimento popular, em
relação ao Estado, aos governos, aos
patrões e à institucionalidade!
FRENTE INDEPENDENTE PELA MEMÓRIA, VERDADE E
JUSTIÇA-MG
Na luta desde outubro de 2012