8 DE MARÇO – DIA INTERNACIONAL DA
MULHER:
PELA RADICALIZAÇÃO DA LUTA FEMINISTA!
Em 2016, a
plurissecular luta feminista tem ainda longo caminho a percorrer. O Brasil mantém o seu lugar no pódio mundial como
um dos campeoníssimos em violência contra as mulheres – assédios, espancamentos,
mutilações, estupros e assassinatos, dentro e fora de casa. A mal chamada violência simbólica, aquela que está
presente no nosso cotidiano e contamina todas as malhas da sociedade, reforça o
processo de naturalização da subalternidade e da exclusão das mulheres. Machismo, sexismo, feminicídio, misoginia, lesbofobia,
transfobia e racismo constituem peças fundamentais do arsenal de dominação
brandido pelo terrorismo de Estado, do capital e do fundamentalismo religioso. Trata-se do reacionarismo institucional
parafascista presente em todas as instâncias do Estado e no aparato midiático.
O Estado
brasileiro mantém também a liderança mundial do país em mais duas modalidades diretamente
vinculadas à violência contra as mulheres: concentração de renda e desigualdade
social. A opressão sofrida pelas
mulheres tem recorte muito preciso determinado por gênero, classe e etnia. São
as mulheres trabalhadoras, pobres e negras, suas principais vítimas – além das
mulheres das comunidades indígenas, estas em fase final de extermínio. O
caráter de classe desta opressão é, portanto, evidente: exploração de classe e
opressão de gênero se retroalimentam no projeto burguês de dominação, o
totalitarismo de mercado – verdadeiro nome do neoliberalismo.
O governo Dilma Rousseff (PT, PMDB, PCdoB e demais
aliados), assim como o PSDB de Alckmin, Aécio Neves, Anastasia e seus asseclas,
seguem à risca a cartilha do totalitarismo de mercado. A lógica do tal reajuste fiscal proposto pelo governo federal é a aniquilação dos
direitos e conquistas das lutas dxs trabalhadorxes. O aumento exponencial da
repressão e da criminalização dos movimentos sociais – leia-se genocídio do
povo negro, genocídio dos povos indígenas, assassinatos de trabalhadorxs do
campo, guerra generalizada contra os pobres, política de encarceramento em
massa – completam este quadro. A criminalização dos movimentos sociais foi
reforçada pela recente aprovação da lei antiterrorismo por iniciativa do
governo Dilma Rousseff.
A composição do congresso nacional é a mais
reacionária desde os tempos da ditadura militar. Seu presidente, o réu Eduardo Cunha (PMDB) -
juntamente com Jair Bolsonaro (PP) e a bancada BBB (Boi, Bala e Bíblia) – ataca
de maneira sistemática e contumaz os movimentos feministas e as comunidades
LGBTs. No ano passado, manifestações dos
movimentos feministas de todo o país contra os ataques de Eduardo Cunha no que
se refere ao direito ao aborto foram brutalmente reprimidas. Em Belo Horizonte,
a Polícia Militar, a mando do governador Fernando Pimentel (PT), espancou e
deteve várias companheiras. Lembremos ainda que várias companheiras foram
espancadas, presas e indiciadas simplesmente por participarem das manifestações
de 2013, 2014 e 2015.
São as mulheres as mais atingidas pelo pacote
urdido pelo governo federal: tentativas de institucionalização da terceirização/precarização
do trabalho, reforma da previdência
social, política de desemprego, cortes radicais de verbas, sucateamento da saúde
e educação. São ainda as mulheres as mais atingidas pelo modelo de controle e
reengenharia da cidade imposto pelo sistema: remoções forçadas baseadas na
lógica da higienização, segregação,
privatização e militarização do espaço urbano cujo paradigma é constituído
pelas UPPs. O modelo de apartheid
social é levado ao paroxismo em Belo Horizonte pela prefeitura de Márcio
Lacerda (PSB/PSDB).
A luta pelo direito ao aborto livre, seguro e
gratuito, bandeira histórica do movimento feminista, desvela de maneira
exemplar o caráter de classe da criminalização do aborto que vigora no Brasil.
Em pleno ano de 2016, a questão da descriminalização do aborto continua a ser
anátema para a cultura patriarcal hegemônica, o que implica em graves violações
dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Insiste-se em manter a
genitália feminina sob controle cerrado do Estado, da Igreja e do
fundamentalismo cristão. As mulheres brasileiras, assim, não têm direito ao
controle do próprio corpo e ao livre exercício da sexualidade. De novo: são as mulheres pobres e negras as
maiores vítimas desta situação. São elas que são submetidas sistematicamente às
condições iníquas da clandestinidade e dos riscos dos abortos ilegais. Para
aquelas que têm dinheiro, existem as clínicas particulares onde o aborto continua
clandestino mas é tolerado desde que se possa
pagar por este serviço mais razoável.
A epidemia do zica vírus e da microcefalia escancarou ainda mais o
caráter de classe da criminalização do aborto e da tentativa covarde por parte
do governo de transferência de responsabilidades: é o Estado o responsável pela
epidemia de zica – é também ele o responsável por todas as suas sequelas, que
atingem pelo menos duas gerações. A decisão de prosseguir ou não a gestação,
por outro lado, deve ser prerrogativa exclusiva das mulheres atingidas – e de
ninguém mais.
Para concluir, voltemos à história do 8 de
março: trata-se de luta
contra-hegemônica e estrutural, que visa a transformação radical da
sociedade. Segundo a tradição, a luta
feminista contra a sociedade machista e patriarcal deve ser travada no registro
da luta contra a dominação burguesa, contra o Estado e o capital. Retomemos as energias utópicas das mulheres
que, há 145 anos, construíram a Comuna de Paris; daquelas que, há 99 anos, se
colocaram à frente da Revolução Russa; e daquelas que, há 80 anos, de armas na
mão, combateram na Guerra Civil Espanhola. Saudemos as indígenas do México e as
zapatistas que defendem seus territórios livres contra o neoliberalismo, contra
o governo e o Estado mexicanos. Saudemos
igualmente a luminosa radicalidade das guerrilheiras curdas de Rojava - das
Unidades de Proteção das Mulheres (YPJ) - que, neste ano de 2016, estão a lutar
pela emancipação das mulheres, pelo fim do Estado-nação capitalista e do
sistema patriarcal a que o povo curdo tem sido submetido há séculos. Todas estas lutas têm forte tradição feminina
e feminista na perspectiva da autonomia e da luta anticapitalista.
Prestemos nossa homenagem às companheiras trabalhadoras
- pobres, negras e indígenas - que, na cidade e no campo, nas ocupações, vilas,
favelas e periferias se mantêm firmes na luta cotidiana contra a exploração, a opressão
e a repressão. Unamo-nos às mulheres de Bento Rodrigues e a todas as atingidas pelo
desastre socioambiental provocado pela Samarco/Vale/BHP Billiton com a cumplicidade
dos governos municipais, estaduais e federal.
Repudiemos o Estado de Honduras que, no dia
03/03/2016, assassinou Berta Cáceres, referência histórica da luta pelos direitos
humanos e pelos territórios indígenas contra as investidas das hidrelétricas,
do Estado e dos paramilitares. Solidarizemo-nos com as mulheres da Índia na sua
luta permanente contra os estupros sistêmicos que assolam aquele país.
Resgatemos,
enfim, a memória das companheiras que tombaram na luta contra a ditadura
militar no Brasil (1964-1985) e de todas as mulheres que foram mortas e
desaparecidas pelas ditaduras do Cone Sul da América Latina. O golpe militar da
Argentina (1976-1983) – que engendrou o assassinato de 30 mil pessoas - faz 40
anos no dia 24/03/2016. Esquecer, nunca!
· - Viva a
radicalidade histórica da luta das mulheres! Viva a luta feminista! Viva o dia
8 de março!
· - Nossas
homenagens às mulheres que tombaram na luta contra todas as formas de opressão
e exploração!
· - Todo o
apoio às mulheres trabalhadoras; às moradoras das ocupações, vilas, favelas e
periferias; às moradoras de comunidades quilombolas e indígenas nas suas lutas
cotidianas contra o terrorismo de Estado e do capital!
· - Pela legalização do aborto: direito ao aborto seguro e gratuito já! Pelo
fim da criminalização do aborto!
· - Pelo fim dos assassinatos e da violência contra as mulheres! Abaixo o
feminicídio, o machismo e o sexismo!
- Abaixo a misoginia, a lesbofobia e a transfobia! Abaixo o racismo!
Belo Horizonte, 8 de março de 2016
INSTITUTO
HELENA GRECO DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA (IHG-BH/MG)
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Da esquerda para direita: Presas esperando deportação por participarem da Comuna de Paris (1871); Revolução Russa (1917); Guerra Civil espanhola (1936 - 1939); Panteras Negras (anos 1960); Manifestação feminista (anos 1960); Zapatistas (atualidade); Curdas de Rojava das Unidades de Proteção das Mulheres/YPJ (atualidade) e Detalhe da obra de Angel Aragonés.
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