Ass.: Coletivo pela construção de uma Frente Independente pela Memória, Verdade e Justiça-MG
( Participação de ex-presos políticos, familiares de mortos e
desaparecidos, militantes, apoiadores, entidades , movimentos populares,
sociais e políticos).
DISTRIBUÍDA E LIDA NA AUDIÊNCIA "PÚBLICA" DA
COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE REALIZADA NA UFMG.
COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE REALIZADA NA UFMG.
Carta aberta à Comissão Nacional da
Verdade
Belo Horizonte, 22 de outubro de 2012
Nesta
primeira audiência pública da Comissão Nacional da Verdade /CNV, em Minas
Gerais, nós, do coletivo pela construção de uma Frente Independente pela Memória,Verdade e Justiça-MG, vimos a público manifestar nossa posição crítica
em relação à concepção que fundamenta encaminhamentos que consideramos
insatisfatórios, antidemocráticos e equivocados. Abordaremos questões que
constituem algumas das nossas exigências. Estamos convencidos da legitimidade
da explicitação do dissenso neste fórum – é para isto, afinal, que servem as
audiências públicas. Antes de mais nada, porém, saudamos os companheiros e
companheiras que aqui deram o seu testemunho de luta contra a ditadura militar
e prestamos nossa homenagem a todas e todos que combateram e tombaram por ousar
acreditar no sonho de uma sociedade igualitária, sem opressores e oprimidos.
Esclarecemos que nosso coletivo se formou a partir de atividades -
manifestações, debates, intervenções, reuniões - realizadas com a participação
de ex-presos políticos, familiares de mortos e desaparecidos, militantes,
apoiadores, entidades , movimentos populares, sociais e políticos. O que nos
une é o entendimento de que Verdade e Justiça são irredutíveis e que, ao
contrário, verdade e reconciliação são termos excludentes: repudiamos,
portanto, este binômio. Constatamos
com indignação que o Estado brasileiro continua a deter gigantesco arsenal para
o exercício da violência, acumulado em processo histórico de longa duração e
consolidado nos vinte e um anos de ditadura militar sangrenta e nestes 27 anos de transição conservadora. O
aparelho repressivo tentacular, então montado, segue operando a partir da violência explícita: o Estado Penal vigente é o sucessor do Estado de Segurança Nacional – implantado
pela ditadura militar.
É
este o terrível legado da ditadura que institucionalizou a tortura,
transformando-a em política de Estado. Institucionalizou também a cultura do
sigilo, a fabricação do esquecimento, a destruição continuada do espaço público
e a criminalização do dissenso. Tal legado continua em vigor, como mostram as
seguintes evidências: a permanência da tortura e do aparato repressivo; a
proibição do acesso aos arquivos da repressão; a guerra generalizada contra os
pobres; a criminalização dos movimentos populares; a não solução da questão dos
mortos e desaparecidos políticos; a impunidade dos torturadores e assassinos de
presos políticos e daqueles que cometem os mesmos crimes nos dias de hoje.
Permanecem no poder – no legislativo,
executivo, judiciário e na burocracia universitária - muitos daqueles que
articularam o golpe e foram protagonistas ativos da ditadura militar. Continuam
em vigor as estruturas de dominação próprias de um Estado de exceção
permanente, potencializadas pelo totalitarismo do mercado.
Ainda
não conquistamos o direito à verdade, à memória e à história, o que passa
necessariamente pela construção de uma Comissão de Verdade e Justiça
independente e popular. Consideramos inaceitável a Comissão Nacional da Verdade
que exclui a Justiça, cuja efetividade foi comprometida desde o Projeto de Lei 7376, de 20 de maio de 2010. A
Comissão da Verdade sem Justiça, instaurada pela lei 12 528, de 18 de novembro
de 2011, expressa a concepção conservadora do governo, de sua base aliada e do
conjunto dos parlamentares. Trata-se de interdição do debate público e de
fidelidade ao compromisso imposto pelas forças armadas e pelos empresários que
articularam e sustentaram a ditadura militar: a sua essência é constituída pela
manutenção da impunidade – ou melhor, da inimputabilidade - dos torturadores e
assassinos de opositores e pela consolidação de uma cultura da conciliação. A
tortura e a estratégia do esquecimento se mantêm, assim, como duas das
instituições mais sólidas do país.
A seguir,
nossos questionamentos mais pontuais relativos aos encaminhamentos da CNV e a esta
audiência pública, que é a primeira aqui em MG – não sabemos quando será a
próxima ou se haverá uma próxima:
·
Parece ter havido hierarquização,
institucionalização e elitização inaceitáveis. Esta audiência, denominada
“pública”, não foi amplamente divulgada nem mesmo entre os que foram atingidos
pela repressão no âmbito das universidades mineiras, sejam alunos, funcionários
ou professores e respectivos familiares. Muitos daqueles diretamente
interessados não foram sequer informados da realização deste evento.
·
A agenda da CNV nestes dois dias de estada em BH privilegiou a academia,
corporações profissionais e visita a projeto de pesquisa. Tudo isto em
detrimento da abertura de interlocução com os familiares de mortos e
desaparecidos políticos, os ex-presos políticos, a militância estudantil e os
movimentos populares, que foram alijados do processo. Tem sido esta a tendência da CNV.
·
Predominaram a cultura do sigilo, as reuniões fechadas,
a falta de transparência e de clareza quanto aos critérios de escolha do tema e
da implementação dos trabalhos.
·
Este
formato – audiência pública “temática” com caráter de evento - inviabilizou até
mesmo o início da discussão de questões que consideramos candentes como:
localização dos cemitérios clandestinos mineiros; a questão dos desaparecidos
políticos; obstáculos interpostos ao acesso aos arquivos da repressão – todos
eles; limitações e lacunas inaceitáveis quanto aos arquivos do DOPS, que já estão
sob a guarda do Arquivo Público Mineiro; a transformação dos centros de tortura
(com destaque para o antigo DOPS) em lugares de memória, na perspectiva
daqueles que combateram e foram vítimas do terror de Estado; a problematização
do questionável Memorial da Anistia, também articulado na cúpula do poder
executivo e da burocracia universitária.
Reiteramos que temos como questão de princípio a responsabilização e punição de todos aqueles que cometeram crimes contra a humanidade. O Estado brasileiro foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 14 de dezembro de 2010, exatamente pela prática destes crimes, tendo sido considerado culpado pelo extermínio dos guerrilheiros do Araguaia. A Corte Interamericana dos Direitos Humanos determinou que os restos mortais destes companheiros sejam devolvidos às famílias e que os responsáveis sejam punidos, assim como todos que praticaram crimes semelhantes durante a ditadura. Determinou também que os arquivos da ditadura sejam abertos, que sejam removidos todos os obstáculos para a punição dos responsáveis pelas torturas, mortes e desaparecimentos e que a sociedade brasileira tenha, finalmente, acesso à sua própria história. Até agora, nada foi feito no que se refere ao cumprimento da sentença.
Reiteramos que temos como questão de princípio a responsabilização e punição de todos aqueles que cometeram crimes contra a humanidade. O Estado brasileiro foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 14 de dezembro de 2010, exatamente pela prática destes crimes, tendo sido considerado culpado pelo extermínio dos guerrilheiros do Araguaia. A Corte Interamericana dos Direitos Humanos determinou que os restos mortais destes companheiros sejam devolvidos às famílias e que os responsáveis sejam punidos, assim como todos que praticaram crimes semelhantes durante a ditadura. Determinou também que os arquivos da ditadura sejam abertos, que sejam removidos todos os obstáculos para a punição dos responsáveis pelas torturas, mortes e desaparecimentos e que a sociedade brasileira tenha, finalmente, acesso à sua própria história. Até agora, nada foi feito no que se refere ao cumprimento da sentença.
Sabemos que somente o combate da classe trabalhadora e do movimento popular terá condições de erradicar de vez esta herança da ditadura militar. A única maneira de reverter esta situação de barbárie é o fortalecimento da nossa luta com radicalidade, unidade e horizontalidade.
Por outra Comissão da Verdade que faça Justiça,que seja independente e de controle popular!
Pelo
cumprimento da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos que
condenou o Estado brasileiro a resolver a questão dos mortos e desaparecidos
políticos!
Pela
abertura irrestrita dos arquivos da repressão!
Pela
punição dos torturadores e assassinos de opositores durante a ditadura militar!
Pela
erradicação da tortura e pelo desmantelamento do aparato repressivo!
Abaixo
a repressão! Abaixo as UPPs e invasões policiais e militares dos morros,
universidades, ocupações e favelas!
Pelo
fim do genocídio dos jovens, negros, indígenas e pobres!
Pelo
fim da criminalização dos pobres, dos movimentos populares e da luta política!
Ass.: Coletivo pela construção de uma Frente Independente pela Memória, Verdade e Justiça-MG
Convidamos
todas e todos para a reunião de construção de uma Frente Independente pela
Verdade, Memória e Justiça-MG:
Segunda-feira,
dia 22 de outubro de 2012 / Local : IHG - Rua Hermilo Alves, 290, Santa
Tereza, BH/MG
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