quarta-feira, 27 de agosto de 2025

46 ANOS DA LEI DE ANISTIA PARCIAL: ONDE ESTÃO OS DESAPARECIDOS?

Forte pressão popular pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita obrigou a ditadura militar (1964-1985) a pautar a questão. Foi imposta, então, uma lei de anistia parcial e restrita – a lei 6683, de 28 de agosto de 1979. Com ela a ditadura garantiu sua autoanistia. Os opositores do regime não foram todos anistiados. Houve anistia total e automática só para os agentes do Estado que sequestraram, prenderam, torturaram, estupraram, assassinaram, esquartejaram e desapareceram corpos. Tornaram-se inimputáveis policiais e militares que perpetraram crimes contra a humanidade, assim como empresas, patrões e latifundiários cúmplices destes crimes.

A autoanistia da ditadura foi rejeitada pelo movimento pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita. Este teve como protagonistas os familiares de mortos e desaparecidos políticos, o Movimento Feminino pela Anistia (MFPA), os Comitês Brasileiros pela Anistia (CBAs), os presos políticos, os exilados e banidos. Teve caráter de massa: houve grande mobilização da classe trabalhadora, do movimento negro, do movimento estudantil, de religiosos progressistas e demais movimentos populares.

Tivemos avanços ao longo destes 40 anos (1985-2025) de transição política pactuada e sem ruptura. Avanços, contudo, pontuais - alguns mais, outros menos significativos. Todos são resultados de muita luta. Exatamente neste 28 de agosto, em Belo Horizonte, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos faz a entrega das certidões de óbito retificadas a familiares de mortos e desaparecidos. Nelas o Estado assume a responsabilidade pelas mortes e desaparecimentos - algo relevante, embora simbólico e tardio. Trata-se de árdua conquista da luta quinquagenária e transgeracional dos familiares, referência de combatividade e tenacidade para todos nós.

As questões cruciais do legado da ditadura ainda incrustado no Estado, no entanto, não foram sequer tangenciadas. Hoje constituem a essência da luta pelos Direitos Humanos e por Memória, Verdade e Justiça, a qual continua a rejeitar a anistia parcial imposta pela ditadura. Continua também a reafirmar os princípios da Anistia Ampla, Geral e Irrestrita, os quais continuam valendo: a abertura irrestrita dos arquivos da ditadura; a resolução da questão dos mortos e desaparecidos; o desmantelamento do aparato repressivo. E ainda: a responsabilização de agentes da repressão, empresários e latifundiários que participaram da ditadura. O Estado brasileiro não cumpriu sequer a sentença do processo de desaparecimento forçado dos guerrilheiros do Araguaia, transitado em julgado em 2003. Tampouco acatou a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que condenou o Brasil por este crime em 2010.

É preciso também completar a lista de mortos e desaparecidos acrescentando os nomes dos milhares de indígenas, quilombolas, trabalhadores do campo e vítimas da violência policial – sobretudo negros, periféricos e pobres. A tortura, o extermínio e o desaparecimento forçado continuam sistêmicos. O Brasil tem a polícia mais letal do mundo. Pratica a guerra generalizada contra os pobres e o encarceramento em massa. É o país das chacinas periódicas e do genocídio institucional do Povo Negro e dos Povos Indígenas. A chacina dos trabalhadores sem terra de Corumbiara completou 30 anos neste mês de agosto, sem qualquer solução. O país é campeão mundial em transfeminicídio e em violência de gênero.

Assim, não estamos aqui a comemorar a lei de anistia parcial e restrita. Estamos a resgatar a luta pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita e a luta permanente contra o terrorismo de Estado. Estamos também a comemorar a novidade alvissareira dos quase cinco meses do Memorial dos Direitos Humanos (antiga sede do DOPS/MG e do DOI-CODI) ocupado pelos movimentos sociais desde 1º de abril – dia de repúdio aos 61 anos do golpe militar. Este Memorial está sendo construído na prática como lugar de memória, de resistência e de consciência. É território de denúncia permanente dos crimes da ditadura e do terrorismo de Estado – um Memorial contra o esquecimento.

Todas estas lutas são estruturais. Elas compõem o tributo que devemos às companheiras e companheiros que tombaram na luta contra a ditadura. Elas e eles estão presentes hoje e sempre! Toda nossa solidariedade às vítimas do terrorismo de Estado e do capital!

PELO DIREITO À MEMÓRIA, À VERDADE E À JUSTIÇA!

Belo Horizonte, 28 de agosto de 2025

Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania - BH/MG

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