domingo, 26 de junho de 2022

26 DE JUNHO DE 2022: DIA INTERNACIONAL DE LUTA CONTRA A TORTURA!

Esta data marca a luta permanente contra a tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, instrumentos de poder fundamentais para a garantia da reprodução do sistema capitalista. O Brasil é um dos países que mais cometem estas graves violações dos Direitos Humanos. É também um dos campeões mundiais em desigualdade social e concentração de renda. Volta a ser o país da fome endêmica. Tem a maior letalidade policial nas chacinas periódicas e nas matanças cotidianas nos morros, favelas, campos e florestas. Tem a terceira maior população carcerária do mundo. É o primeiro em transfeminicídio. Por aqui institucionalizaram-se a tortura e o extermínio.

Vivemos a sedimentação do fascismo em ritmo de escalada. O hiper-militarizado, miliciano e ultraliberal governo Bolsonaro (PL)/Mourão (Republicanos) tem ódio mortal aos Direitos Humanos: é entusiasta da ditadura e tem como paradigmas matadores e torturadores contumazes. Adotou de vez como políticas de Estado o genocídio do Povo Negro e dos Povos Indígenas, o etnocídio, o epistemicídio, o ecocídio, o racismo, a misoginia, a LGBTQIAP+fobia, o patriarcalismo e o patrimonialismo. Seu projeto de poder é o aniquilamento definitivo das conquistas da classe trabalhadora e dos movimentos sociais. É também o paroxismo do aviltamento do senso comum e das relações de convivência. Obscurantismo e negacionismo são métodos de governo.  O cenário recente de iniquidades  constitui síntese desta necropolítica abjeta.

Há um mês (25/05), em Umbaúba/Sergipe, Genivaldo de Jesus Santos foi executado por asfixia pela Polícia Rodoviária Federal, cuja viatura funcionou como câmara de gás. Genivaldo tinha 38 anos, era negro e usuário do serviço de saúde mental. Sua execução aconteceu a céu aberto e confirmou que camburões e caveirões são os atuais tumbeiros a serviço do racismo estrutural e do genocídio institucional do Povo Negro. 

No dia 05/06, o ativista indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram chacinados na região do Vale do Javari/Amazonas. Os métodos foram os mesmos da ditadura militar (1964-1985) contra as /os guerrilheiras/os do Araguaia (1972-1975): fuzilamento, esquartejamento e incineração dos corpos, na tentativa de fazê-los desaparecer. Esta chacina escancarou para o mundo o horror vivido pelos Povos da Floresta. Com respaldo do judiciário e da mídia corporativa, o governo Bolsonaro/Mourão e a bancada boi/bala/bíblia/jaula têm cumprido à risca seus desígnios: interdição à demarcação das terras indígenas; esbulho daquelas já demarcadas; devastação irreversível de um dos principais biomas do planeta – extermínio institucional dos Povos Indígenas e de seus saberes. Nos últimos anos, centenas de lideranças indígenas foram mortas, assim como trabalhadores rurais, vitimados pelo latifúndio, pelas empreiteiras, madeireiras e mineradoras. Os Povos Isolados são os mais atingidos.  Em abril, uma menina Yanomami de 12 anos foi estuprada e assassinada na Terra Yanomami (sul de Roraima). Sua aldeia foi queimada e toda a comunidade (25 indígenas) está desaparecida. Não houve investigação: a Polícia Federal declarou sumariamente que não havia indícios de crime. Por outro lado, o massacre de Bruno e Dom evidenciaram a pujança da luta dos Povos Indígenas, sempre banalizada e/ou invisibilizada: não fosse a combatividade da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (UNIVARI), os corpos não teriam sido encontrados e a investigação seria dada por concluída. Ficam as perguntas: quem são os mandantes? Cadê os Yanomami?

Ainda neste mês de junho, veio à tona a denúncia da extrema violência institucional sofrida pela menina catarinense de onze anos, grávida em consequência de estupro. Ao procurar o serviço de aborto legal a que tem direito, a criança foi novamente violentada pelo aparato hospitalar e jurídico, ao qual foi submetida. O Brasil tem uma das mais retrógradas leis de aborto da América Latina. Aqui o aborto ainda é criminalizado, com apenas três exceções: estupro, risco de vida para a mãe – situação da criança catarinense - e fetos anencéfalos. Mesmo assim, o hospital se recusou a fazer o procedimento e o judicializou. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, então, protagonizou um dos mais escabrosos episódios de torturas e tratamentos cruéis, desumanos e degradantes que se tem notícia. Chegou-se ao extremo de institucionalizar a criança, privando-a de liberdade e até do convívio com a mãe por 40 dias, para garantir que o aborto não fosse feito. No ano passado foi divulgado o caso semelhante da criança capixaba. Certamente não são casos isolados: o Brasil é também um dos campeões mundiais em número de estupros e gravidez de crianças e adolescentes. O patriarcalismo, a misoginia e o mais nefasto moralismo fundamentalista constituem política de Estado.

Em três anos e meio, o bolsonarismo empreendeu o desmonte total das políticas públicas voltadas para o direito à História, à Memória, à Verdade e à Justiça e das políticas públicas Antimanicomiais. Todas elas constituem árduas conquistas de décadas de luta dos familiares de mortos e desaparecidos políticos, dos movimentos de Direitos Humanos e das/os usuárias/os e trabalhadoras/es dos serviços voltados para a Saúde Mental. A sanha  privatista, proibicionista e punitivista dos governos federal, estaduais e municipais promovem o sucateamento do SUS e o fortalecimento das famigeradas comunidades terapêuticas. Estas são verdadeiras masmorras, campos de concentração e centros de torturas institucionalmente mantidos pelo poder público e geridos pelo fundamentalismo cristão e pelo lobby dos donos de hospitais e hospícios. Mais uma vez, a maioria das vítimas destas instituições é composta de negras/os, pobres e periféricas/os.

Em 1997, a Organização das Nações Unidas (ONU) adotou o dia 26 de junho como Dia Internacional em Apoio às Vítimas de Tortura. Neste dia entrou em vigor a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos e Degradantes. O Brasil, só ratificou o seu protocolo facultativo em 2007. Consideramos este um dia de luto e luta. Nestes 25 anos, longe de ser erradicada, a tortura tem se institucionalizado e intensificado cada vez mais - no Brasil e no mundo. Sabemos que só o enfrentamento combativo, classista e independente poderá combater esta situação de barbárie. O combate à tortura é Antifascista, Anticapitalista, Antirracista e Anticolonial. Por definição, portanto, tem caráter internacionalista.

A radicalização desta luta na perspectiva instituinte é necessária para que possamos prestar o tributo devido a Genivaldo de Jesus Santos, Bruno Pereira, Dom Phillips, às lideranças indígenas e trabalhadoras/es rurais abatidas pelo terrorismo de Estado de ontem e de hoje e às/aos companheiras/os que tombaram na luta contra a ditadura. Lembrando que hoje a Passeata dos Cem Mil (Rio de Janeiro, 26/06/1968) faz 54 anos - uma das maiores manifestações contra a ditadura, em protesto contra a execução do estudante secundarista Edson Luís de Lima Souto pela Polícia Militar do Rio de Janeiro, no restaurante Calabouço (28/03/1968). Nossas homenagens também às vítimas do genocídio sanitário provocado pelo negacionismo bolsonarista ao longo desta pandemia de COVID-19. Nesta sexta-feira, foi ultrapassada a estarrecedora cifra de 670 mil óbitos! É com profunda tristeza que prestamos solidariedade às/aos familiares, companheiras/os e amigas/os.

DITADURA NUNCA MAIS! TORTURA NUNCA MAIS!

ABAIXO O TERRORISMO DE ESTADO!

FASCISTAS: NÃO PASSARÃO!

Belo Horizonte, 26 de junho de 2022

Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania – BH/MG

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