★CENTENÁRIO HELENA GRECO★
Tributo aos mortos e
desaparecidos políticos da ditadura (1964 – 1985).
In memoriam de
Dona Helena Greco:
Centenário
do nascimento (1916 - 2016) e
cinco anos
da morte (15/06/1916 - 27/07/2011).
ATO PÚBLICO DE MILITÂNCIA E INTERVENÇÕES:
Sábado, dia 18 de Junho de 2016, às 16h00min.
Local: Embaixo
do Viaduto Dona Helena Greco
-
Avenida do Contorno com Rua Araguari,
Barro Preto
(região central) – Belo Horizonte/MG.
PROGRAMAÇÃO:
★ PAINÉIS SEGUIDOS DE MICROFONE ABERTO:
*Cecília Coimbra (RJ) – Perseguida, presa e torturada durante
a ditadura. É membro do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro (GTNM/RJ).
*Diva Moreira (MG) - Militante histórica do
movimento negro e da luta contra a ditadura. Participou do Movimento Feminino
pela Anistia de Minas Gerais (MFPA/MG).
*Amelinha Teles (SP) – Perseguida, presa e torturada
durante a ditadura. É membro da Comissão de Familiares de Mortos e
Desaparecidos Políticos, da União de Mulheres de São Paulo e das Promotoras
Legais Populares.
★ EXIBIÇÃO DO DOCUMENTÁRIO:
*ARQUIVOS IMPERFEITOS
- Brasil, 2006 - 10 min.
Direção: Sávio Leite.
Sinopse:
Os que jogaram bombas jamais foram
pegos, como até hoje não foram responsabilizados os que torturaram, mataram e
fizeram desaparecer opositores políticos da ditadura militar. Helena Greco, em
Minas Gerais se tornou o símbolo da luta pela anistia. Dava guarita a
perseguidos políticos, organizava reuniões, fazia plantão em portas de
delegacias e, desafiando o SNI embarcou para Roma, representando o Brasil no
Congresso Mundial de Anistia. Aos 90 anos já não lembra de muitas coisas. Já
não fala tanto. Ao menos já não fala com as palavras, porém seus olhos seguem
dizendo.
★ LANÇAMENTO DO DOCUMENTÁRIO:
*DESARQUIVANDO O BRASIL
- Brasil, 2016 - 13 min.
Direção: Sávio Leite - presença do
diretor.
Sinopse:
Registro de ato em homenagem às vítimas
da ditadura militar (1964 – 1985) e coleta de material genético de familiares
de desaparecidos políticos mineiros. Teve como objetivo formar um banco de DNA
de familiares para tentar identificar os restos mortais dos desaparecidos. O
ato Desarquivando o Brasil aconteceu
no dia 07 de maio de 2007, em Belo Horizonte. Foi organizado pelo Instituto
Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania – local onde foi realizado - em
parceria com o Movimento Tortura Nunca Mais/MG. Houve a participação da
Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Apesar da pressão dos familiares e
dos movimentos por memória, verdade e justiça, foi nulo o resultado do banco de
DNA: até hoje nenhum desaparecido político foi identificado com base nas amostras
sanguíneas coletadas porque o governou sucateou e estagnou o projeto.
★ APRESENTAÇÃO TEATRAL:
*Experimento 1: Mostra GUERRILHA
Solo/criação, atuação e
idealização: Idylla
Silmarovi.
Direção: Raquel Castro.
Direção musical: Claudia Manzo.
Sinopse:
Substantivo feminino. Ações
descontínuas de inquietação, emboscadas. A principal estratégia é a ocultação e
extrema mobilidade das combatentes, chamadas de guerrilheiras. Uma mulher que
fala junto à voz de outras. Reconstrução sem linha cronológica de memórias
ainda empoeiradas de ontem. Se as que comandam vão no trá, Guerrilheiras da
américa: uni-vos!
Comandanta Ramona, Maria Bonita,
Violeta Parra, Pagu, Domitila Barrios, Olga Benário, Maria Victoria de Santa
Cruz, Frida Kahlo, Dandara, e tantas outras companheiras de guerrilhas: PRESENTE!
★ APRESENTAÇÃO MUSICAL:
*MPB de protesto e músicas próprias
Voz e violão: Ênio Poeta.
★ DISCOTECAGEM REVOLUCIONÁRIA:
- DJ
Guerrilha.
- DJ Confusa.
★ INSTALAÇÃO:
*URGÊNCIAS DO PRESENTE
- Alice Costa Souza.
Realização:
Instituto Helena Greco de Direitos
Humanos e Cidadania (IHG – BH/MG).
Parceria:
Idylla Silmarovi e Sávio Leite.
Apoio:
Frente Independente pela Memória,
Verdade e Justiça de Minas Gerais (FIMVJ/MG).
Evento em rede social:
★SOBRE O ATO
PÚBLICO CENTENÁRIO HELENA GRECO★
O Instituto
Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania – juntamente com parceiros e
apoiadores – convida todas e todos para o Centenário Helena Greco.
Este ato público terá lugar embaixo do Viaduto Dona Helena Greco. Até
2014, o viaduto tinha o nome de Castelo Branco, primeiro ditador imposto pelo
golpe militar de 1964.
Há dois
anos, no dia 1º de abril de 2014 – 50 anos do golpe – foi feita a renomeação
popular do viaduto, que passou a se chamar D. Helena Greco. Neste dia foi
realizado o seguinte ato público: “MANIFESTAÇÃO EM REPÚDIO AO GOLPE DE 1964
– 50 ANOS! ABAIXO A DITADURA!”. Este foi convocado pela Frente Independente
pela Memória, Verdade e Justiça de Minas Gerais (FIMVJ/MG), da qual o Instituto
Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania participa. Foi feito tributo aos
mortos e desaparecidos políticos. Foi exigida a mudança do nome do Viaduto para Dona
Helena Greco. Houve intervenções com faixas, cartazes, banners e um
expressivo silhuetaço. Este silhuetaço
foi realizado pelo Grupo de Pesquisas Estratégias da Arte numa Era de
Catástrofes da EBA/UFMG. As pistas do viaduto foram ocupadas.
Houve falas de militantes, ex-presos políticos e familiares de mortos e
desaparecidos. Estiveram presentes entidades, movimentos, trabalhadores(as) e
estudantes. Criméia Schmidt de Almeida - presa durante a ditadura, familiar de
desaparecido e ex-guerrilheira do Araguaia - veio de São Paulo e participou da
manifestação. Depois de muita pressão, o nome Viaduto Dona Helena
Greco foi oficializado no dia 02/05/2014. Até hoje, no entanto, ele
não foi identificado com a instalação de placas indicando o seu nome.
Os objetivos
do ato público Centenário Helena Greco - que acontecerá no dia
18 de junho de 2016 - são:
• prestar homenagem aos mortos e
desaparecidos políticos da ditadura e a todas as vítimas do aparato repressivo
nos dias de hoje;
• resgatar a memória da luta contra a
ditadura, a luta pelos direitos humanos e a trajetória de Helena Greco;
• debater e repudiar o terrorismo de
Estado e do capital;
• garantir a identificação do Viaduto,
já que não existe no local e no entorno nenhuma visualização física do seu
nome;
• propor a consolidação do viaduto como
lugar de memória para que todas e todos – movimentos, entidades, indivíduos e
militância – façam intervenções/ocupações permanentes neste espaço.
Assim, neste
ato público reafirmaremos nossas lutas:
- Em defesa dos Direitos Humanos e luta
contra o terrorismo de Estado e do capital/ luta contra o terrorismo
institucional.
- Pela luta anticapitalista, abaixo o
neoliberalismo!
- Abaixo a fascistização das
instituições e de setores da sociedade!
- Pelo direito à História, à Memória, à
Verdade e à Justiça! Punição para os responsáveis por torturas, mortes e
desaparecimentos durante a ditadura militar e para aqueles que cometem estes
mesmos crimes contra a humanidade nos dias de hoje!
- Pela abertura irrestrita dos arquivos
da repressão!
- Pelo fim de todo o aparato
repressivo! Não acabou, tem que acabar: eu quero fim da polícia
militar!
- Pelo fim das torturas, execuções e
desaparecimentos forçados!
- Pelo fim do genocídio do Povo Negro!
Pelo fim do genocídio dos Povos Indígenas!
- Pela demarcação de todos os
territórios indígenas e quilombolas!
- Abaixo o racismo, o estereotipismo, o
eugenismo e a gerontofobia!
-Pelo fim da criminalização dos pobres!
- Pelo fim do extermínio de jovens e
moradorxs de periferias, vilas, morros, favelas e ocupações!
- Pelo fim das chacinas no campo
cometidas pelo latifúndio e o agronegócio! Abaixo o terrorismo do latifúndio!
Terra para quem vive e trabalha!
- Pelo fim do extermínio e da violência
contra as mulheres! Abaixo o feminicídio, a misoginia, o machismo e o sexismo!
Pela erradicação da cultura do estupro!
- Pela legalização do aborto: direito
ao aborto seguro e gratuito já!
- Abaixo a homofobia, a lesbofobia, a
transfobia, os assassinatos e a violência contra a comunidade LGBTs!
- Não a redução da maioridade penal!
- Abaixo a política de encarceramento
em massa! Por uma sociedade sem prisões e sem manicômios!
- Todo apoio às ocupações dxs
estudantes secundaristas! Todo apoio às greves dxs professorxs!
- Pela liberdade de protesto,
manifestação e expressão. Pelo fim da criminalização da luta dos Trabalhadorxs
do campo, da cidade e do movimento popular! Abaixo a lei antiterrorismo!
- Pelo fim dos processos e pelo
trancamento de todas as ações penais contra manifestantes! Pela libertação
imediata dxs presxs políticxs!
- Viva a luta independente da classe
trabalhadora e do movimento popular!
★SOBRE HELENA
GRECO (15/06/1916 – 27/07/2011)★
Pequena biografia
A nossa cidadania depende
diretamente da nossa capacidade de indignação. Esta,
por sua vez, só se
concretiza a partir do exercício permanente da
perplexidade.
Helena Greco
Helena Greco
nasceu em Abaeté, cidade do oeste de Minas, a 15 de junho de 1916, de pai
italiano (Antônio Greco) e mãe mineira (Josefina Álvares Greco). Sua primeira
transgressão foi a leitura dos clássicos quando ainda vigorava o index
librorum proibitorum. Adquiriu formação humanista e se manteve
agnóstica em pleno internato dominicano, em Belo Horizonte. Adorava recitar
Augusto dos Anjos, um dos seus poetas preferidos. Este gosto pela poesia e
pelos clássicos ela carregou a vida inteira, juntamente com uma cinefilia
exacerbada. Talvez estas tenham sido fontes onde ela hauriu para depois
desenvolver a peculiar capacidade de indignação, sua característica mais
marcante.
Era
farmacêutica de formação, militava no seu sindicato. No Conselho Regional de
Farmácia há uma sala com o seu nome. Foi casada durante 64 anos com o saudoso
Dr. José Bartolomeu Greco (falecido a 6 de janeiro de 2002), seu companheiro da
vida inteira. Teve três filhos, três netos e dois bisnetos – o mais novo não
chegou a conhecer.
Começou a militar
aos 61 anos de idade, em 1977, e não parou mais. Sua participação nos
movimentos sociais - reconhecida nacional e internacionalmente - tem como marco
a luta pela Anistia, Ampla, Geral e Irrestrita, da qual ela se tornou
praticamente sinônimo. Foi presidente e uma das fundadoras do Movimento
Feminino pela Anistia de Minas Gerais (MFPA/MG - 1977) e vice-presidente do
Comitê Brasileiro de Anistia de Minas Gerais (CBA/MG - 1978). Ajudou a
construir e foi membro do Comitê Executivo Nacional/CEN destas entidades. Foi a
representante do Brasil – eleita por aclamação - na Conferência Internacional
pela Anistia no Brasil em Roma, em junho-julho/1979.
Todos a
chamavam de D. Helena. Ela imprimiu a sua atitude de
radicalidade e politização em toda a sua história de militância, sempre a
partir da combinação luta contra a ditadura militar/ luta feminista. Eram
notáveis sua capacidade de indignação e adesão permanente às causas da classe
trabalhadora e do movimento popular.
Tornou-se
inimiga pública da ditadura, dos militares, das polícias, dos grupos de
extermínio, dos grupos parapoliciais e paramilitares e do aparato midiático.
Seu foco principal era a luta pelo desmantelamento do aparato repressivo –
portanto, pela erradicação da tortura e pela punição dos torturadores. Durante
a ditadura, sua casa e a sede do MFPA e do CBA foram alvos de atentados a bomba
do Comando da Caça aos Comunistas (CCC), do Grupo Anticomunista (GAC) e do
Movimento Anticomunista (MAC). Teve o telefone grampeado, a vida monitorada, a
correspondência violada. Recebia constantes ameaças e provocações do aparato
repressivo e dos grupos de extrema direita.
No final da
década de 1970, em plena ditadura, ela retomou, em Belo Horizonte, as
manifestações públicas do Dia Internacional da Mulher (8 de março). Tal
retomada se deu na perspectiva da luta pela superação da discriminação, do
preconceito, da violência, da brutal desigualdade de gênero – sistêmica nesta
sociedade tão arraigadamente patriarcal e machista, tão exploradora e
opressora. A partir de 1978, firmou a realização anual de manifestações no Dia
Internacional dos Direitos Humanos (10 dezembro) no bojo da luta contra a
ditadura militar.
Sua luta
contra a ditadura se desdobrou na luta contra todas as formas de opressão cujo
lado afirmativo é a construção do binômio Direitos Humanos e Cidadania.
Entendia esta como uma luta contra hegemônica para a construção de uma nova
sociedade, sem exploradores e explorados – a sociedade socialista. Além de sua
militância feminista, apoiou ativamente o movimento negro, a luta dos povos
indígenas, participou da luta antiprisional, da luta antimanicomial, do
movimento LGBTs, do movimento dos sem terra e sem teto, do movimento de
população de rua, do movimento das vilas e favelas, das ocupações, das lutas
dos estudantes e dos trabalhadores, do movimento das rádios e TVs comunitárias
e da defesa do povo palestino.
Por causa
deste repertório de lutas, D. Helena se elegeu duas vezes para a Câmara
Municipal de Belo Horizonte pelo Partido dos Trabalhadores, do qual foi uma das
fundadoras. Foi vereadora de 1983 a 1992. Mesmo no espaço instituído, ela
sempre atuou na perspectiva do instituinte, da amplificação da política. Sua
militância partidária se deu no marco – hoje drasticamente aniquilado - de um
partido independente, classista e socialista: sem pelego e sem patrão, como se propunha à época da sua fundação.
D. Helena criticou e combateu sistematicamente o burocratismo, o centralismo, o
autoritarismo, o gabinetismo e o peleguismo da tendência majoritária. Tais desvios,
que hoje prosperam sem limites no PT, então já começavam a despontar.
No espaço
eminentemente reacionário da Câmara Municipal, ela conseguiu, em 1983, fazer
aprovar a Comissão Permanente de Direitos Humanos – a primeira do Brasil - cujo
programa político se bifurcava na luta contra a repressão, a opressão, a
exploração dos trabalhadores e do povo e na luta contra a discriminação e
desigualdade de gênero. Tudo isto ainda durante a ditadura militar. Efetivou,
em conjunto com o vereador Artur Vianna, a mudança do nome da Rua Dan Mitrione
para Rua José Carlos da Matta Machado, no Bairro das Indústrias. Dan Mitrione
era um agente da CIA que morou em Belo Horizonte, tendo vindo ao Brasil para
dar aulas de tortura aos agentes da ditadura. José Carlos da Matta Machado era
estudante de direito da UFMG. Militou no movimento estudantil e na Ação Popular
Marxista Leninista/APML. Foi assassinado sob tortura, em 28 de outubro de
1973.
Foi também
D. Helena que idealizou, em 1993, o primeiro órgão na esfera do poder executivo,
no Brasil, voltado exclusivamente para a questão dos direitos humanos - a
Coordenadoria de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de Belo Horizonte
(CDHC) - da qual foi coordenadora até 1996. Estabeleceu como prática a
articulação com as comunidades, os trabalhadores e o movimento popular. Na
CDHC, ela efetivou a Comissão Paritária de Mulheres (10/dezembro/1993), que deu
origem ao Conselho Municipal da Mulher, garantindo o protagonismo dos
movimentos feministas da cidade nesta instância. Trouxe uma delegação das Mães
da Praça de Maio (Argentina) pela primeira vez a Belo Horizonte. A
Coordenadoria de Direitos Humanos e Cidadania se tornou referência para várias
outras, criadas Brasil adentro e afora.
Para D.
Helena, no entanto, o espaço prioritário de atuação sempre foi o chão da cidade
não a estreiteza do espaço institucional. Ao encerrar seu mandato na CDHC, em
1996, ela atuou exclusivamente neste lugar que é o espaço por excelência da
luta de classes e da democracia direta.
Foi uma das
fundadoras do Movimento Tortura Nunca Mais/MG, em 1985. Em 1987, no bojo
da luta pelo reatamento das relações diplomáticas Brasil-Cuba, foi uma das
fundadoras da Associação Cultural José Marti de Minas Gerais e sua primeira
presidente. Foi ela que assinou, em Cuba, o convênio com o Instituto Cubano de
Amizade com os Povos (ICAP).
Sob a sua
coordenação, em fevereiro de 1991, o Movimento Tortura Nunca Mais/MG encaminhou
ao Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG) lista de 12 médicos
legistas que atuaram no estado de 1964 a 1979. Esta lista é resultado de
denúncia de presos políticos cujos processos tramitaram no Superior Tribunal
Militar (STM) e está contida no Projeto Brasil Nunca Mais (Arquidiocese
de São Paulo, 1985). Trata-se de médicos que assinaram laudos de militantes
assassinados nos cárceres após violentas torturas. O objetivo do Movimento
Tortura Nunca Mais/MG era a abertura de sindicância para averiguação da
responsabilidade destes profissionais na assinatura de laudos falsos e o seu
comprometimento com a repressão e a tortura durante a ditadura militar. A
iniciativa do Tortura Nunca Mais/MG estava inserida em processo de âmbito
nacional desencadeado pela descoberta das ossadas de desaparecidos políticos na
vala clandestina do cemitério D. Bosco (Perus/SP), em 1991. Processos
semelhantes foram movidos em São Paulo e no Rio de Janeiro sob a
responsabilidade da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos
e do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ. No Rio e em São Paulo, os processos tiveram
certo resultado: alguns médicos-torturadores chegaram a perder o registro
profissional. Em Minas Gerais, ao contrário, fazendo jus ao reacionarismo e
corporativismo que lhe são peculiares, o CRM-MG engavetou o processo. Na
sequência, duas das médicas citadas entraram com duas ações criminais contra D.
Helena, que foi parar no banco dos réus. Absolvida em primeira instância, foi
condenada no Superior Tribunal de Justiça (STJ), por calúnia e difamação, a um
ano, em regime aberto – o que causou enorme comoção local e nacional. Este
episódio evidencia a drástica inversão de valores no país da barbárie
institucional.
Também em
1991, ela denunciou a chamada Operação Arrastão. Trata-se de ação conjunta das
polícias civil e militar do governo Hélio Garcia (PRS): no dia 22 de agosto de
1991, mais de 500 crianças e adolescentes com trajetória de rua foram caçadas,
espancadas e presas. Belo horizonte foi transformada em praça de guerra - o
Estatuto da Criança e do Adolescente mal tinha completado um ano.
Em 1995, D.
Helena participou da construção e foi uma das coordenadoras do Fórum Permanente
de Luta pelos Direitos Humanos de Belo Horizonte (Movimento popular, sindical e
de Direitos Humanos), o qual articulava cerca de 30 movimentos sociais. Ainda
em maio de 1995 recebeu a medalha Chico Mendes de Resistência oferecida pelo
Grupo Tortura Nunca Mais/RJ, a qual era motivo do maior orgulho e da maior
alegria para ela. Participou como jurada do Tribunal Nacional Contra o Trabalho
Infantil (Brasília, 11/outubro/1995), sessão preparatória do Tribunal
Internacional Independente Contra o Trabalho Infantil no México (março/1996).
Em 1996, ela ajudou a construir e participou da Associação de Apoio e Defesa às
Vítimas da Violência Policial (AADVIP).
D. Helena
repudiou com veemência as chacinas periódicas da década de 1990. Atuou
diretamente na denúncia da Chacina do Taquaril (15/março/1996), na qual foram
assassinados, com requintes de crueldade, Gilmar Ferreira de França (14 anos),
Jamil Martins Romão (15 anos) e Júnior Sandro Marques Morais (16 anos) na
região central de Belo Horizonte. Os três garotos moravam no Taquaril, bairro
pobre da zona leste da cidade. Eles foram trucidados por um grupo de extermínio
composto por policiais civis autodenominado Grupo Reação. O caso
não foi solucionado.
No dia 17 de
junho de 1996, por iniciativa de D. Helena, a Coordenadoria de Direitos Humanos
e Cidadania e o Fórum Permanente de Luta pelos Direitos Humanos de Belo
Horizonte realizaram, na Praça Afonso Arinos, o Tribunal Popular: as
chacinas em julgamento. Seu objeto é constituído pelas 8 chacinas da
década de 1990: Acari/Rio de Janeiro (julho/1990), Carandiru/São Paulo
(outubro/1992), Candelária/Rio de Janeiro (julho/1993), Vigário Geral/Rio de
Janeiro (agosto/1993), Ianomami/Roraima (agosto/1993), Corumbiara/Rondônia
(agosto/1995), Taquaril/Minas Gerais (março/1996), Eldorado de Carajás/Pará
(abril/1996). Participaram como testemunhas sobreviventes e familiares das
vítimas das chacinas. Neste Juri Popular o Estado brasileiro foi condenado em
praça pública, por unanimidade. Mais de 600 pessoas estiveram presentes. A
seguir, um trecho expressivo do panfleto de convocação:
“(...) A periodicidade assustadoramente
regular das chacinas qualifica o Brasil como o país da carnificina. O que está
na base desse quadro é a cultura do extermínio e da impunidade. Todos sabemos
que o grande responsável pela violência no campo é o latifúndio. Os governos
estaduais e o governo federal são os grandes cúmplices. A violência policial é
a projeção direta da violência do Estado. Não dá mais para viver com ela.
(...)”.
Ao longo de
toda a sua trajetória, D. Helena aprofundou a luta contra a violência policial
e institucional e pelo direito à memória, à verdade e à justiça. Para ela, como
o contencioso da ditadura não havia sido sequer equacionado, os pontos
programáticos da luta pela Anistia, Ampla, Geral e Irrestrita continuavam
valendo: a erradicação da tortura; o esclarecimento circunstanciado dos crimes
da ditadura militar; a localização dos restos mortais dos desaparecidos
políticos; a nomeação, responsabilização e punição dos torturadores e
assassinos de presos políticos, bem como daqueles que perpetram os mesmos
crimes contra a humanidade na atualidade; o desmantelamento do aparato
repressivo. D. Helena Greco tornou-se referência de luta contra a tortura - que
continua a ser uma das instituições mais sólidas no Brasil -, contra a opressão
das mulheres, contra a criminalização dos pobres e dos movimentos sociais,
contra o encarceramento em massa, contra o genocídio do povo negro e das
populações indígenas.
A partir de
2002, D. Helena passa a ressentir o peso dos seus 86 anos e se retira da
militância cotidiana. Digamos que aí começa o repouso da guerreira. Seu legado,
no entanto, estava muito forte, muito recente, muito presente. Em 2003, um
grupo de companheiras e companheiros que lutaram com ela ombro a ombro nesta
difícil frente da luta pelos direitos humanos – muitos deles no Movimento
Tortura Nunca Mais/MG – tomaram a iniciativa de construir o Instituto Helena
Greco de Direitos Humanos e Cidadania (IHG – BH/MG). Este se reunia – em 2003 e
2004 – na Casa do Jornalista de Minas Gerais. A partir de 2005, o Instituto
Helena Greco passa a ter sede própria no bairro de Santa Tereza em Belo Horizonte
(Rua Hermilo Alves, 290). Trata-se de espaço e movimento social apartidário. É
autogestionário, autônomo e independente com relação ao Estado, aos governos,
às empresas, aos editais, aos gabinetes e à institucionalidade. O espaço e o
movimento contam com a militância de membros, apoiadores e visitantes. Sua
militância se dá na luta por memória, verdade e justiça – contra o contencioso
da ditadura militar – e na luta contra o terrorismo de Estado e do capital.
Trata-se, portanto, da continuidade e aprofundamento da luta de D. Helena Greco
e do Movimento Tortura Nunca Mais/MG.
D. Helena
faleceu em 27 de julho de 2011, aos 95 anos de idade. Seu enterro tornou-se um
grande ato público repleto de movimentos sociais. Vários companheiros e
companheiras levantaram a proposta de mudar o nome do então Viaduto Castelo
Branco – que fica na região central de Belo Horizonte - para Viaduto
Dona Helena Greco. Houve outro ato público em sua homenagem na Igreja São
José (02/agosto/2011), local escolhido pelos familiares porque suas escadarias
foram o palco de manifestações contra a ditadura.
A casa de D.
Helena Greco (Barro Preto, Belo Horizonte) tornou-se um lugar de memória da
luta contra a ditadura. Além de ter sido alvo de atentados do aparato
repressivo, como já foi dito, era também local de reuniões do movimento pela
anistia e de acolhimento de perseguidos políticos. Além disso, D. Helena abria
a sua casa todos os domingos para servir sua macarronada especial. Estes
almoços se tornaram espaço para encontros e reuniões políticas. Depois da morte
de D. Helena, o Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania – com o
apoio de entidades – realizou, na Semana Internacional dos Direitos Humanos, o
ato público Casa de D. Helena Greco: espaço de resistência (17/dezembro/2011).
Em tributo aos mortos e desaparecidos políticos e à D. Helena Greco, houve uma
jornada de militância: debates sobre direito à História, à Memória, à
Verdade e à Justiça e sobre ocupações e lutas urbanas; exibição
de documentário; performances, recitais de poesia, concerto com músicas
eruditas e canções revolucionárias, bandas underground e manifestações de
movimentos sociais. Foi servida a famosa macarronada da D. Helena. Na fachada
da casa, foi instalada placa com os dizeres:
Casa de Dona Helena Greco:
Espaço de
Resistência
Helena
Greco (1916/2011)
lutou contra
a ditadura militar e contra todas
as formas
de autoritarismo, exploração e
opressão.
A proposta
de mudança do nome do Viaduto Castelo Branco para D.
Helena Greco prosperou. No dia 1º de abril de 2014 – 50 anos do golpe
militar -, em ato da Frente Independente pela Memória, Verdade e Justiça de
Minas Gerais, foi feita a renomeação popular através de um ato público no
viaduto: “Manifestação em repúdio ao golpe de 1964 – 50 anos! abaixo a
ditadura!”. Centenas de manifestantes – familiares de mortos e
desaparecidos, presos políticos durante a ditadura, trabalhadores, estudantes,
movimentos sociais – exigiram a mudança do nome, protestaram e prestaram
homenagens aos mortos e desaparecidos políticos. Houve a ocupação das pistas do
viaduto. O viaduto passou a se chamar D. Helena Greco. Após
este ato público e sob muita pressão a nomeação foi oficializada no dia 02 de
maio de 2014.
Desde o seu
falecimento, D. Helena Greco tem sido lembrada e homenageada das mais diversas
formas como referência de combatividade, radicalidade e capacidade de
indignação. Na última entrevista que deu, aos 90 anos (2006), na gravação do
documentário Arquivos imperfeitos, de Sávio Leite, ao ser
perguntada como se caracterizaria politicamente, ela não titubeou: “Sou
feminista radical, socialista, de extrema esquerda”. A última aparição pública
de D. Helena – já com dificuldade de locomoção - foi no dia 7 de maio de 2007,
no ato Desarquivando o Brasil – homenagem às vítimas da ditadura
militar e coleta de material genético de familiares de desaparecidos políticos.
O ato foi convocado pelo Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania
e o Movimento Tortura Nunca Mais/MG.
Dona Helena
Greco vive, hoje e sempre, em todas as nossas lutas. É a nossa referência de
defesa dos direitos humanos.
Companheira Helena Greco:
presente!
Belo Horizonte, junho de 2016
– Centenário Helena Greco
Instituto Helena Greco de Direitos
Humanos e Cidadania
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