"Estamos aqui pela Humanidade!" Comuna de Paris, 1871 - "Sejamos realistas, exijamos o impossível." Maio de 68

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Reuniões abertas aos sábados, às 16H - militância desde 2003.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

CENSURA E FASCISMO NÃO PASSARÃO!


NOTA DE REPÚDIO AO OBSCURANTISMO VIGENTE
(censura, reacionarismo, intolerância, fundamentalismo e fascismo)
O fascismo não se discute, se destrói.
Buenaventura Durruti
Realmente, vivemos tempos sombrios!
A inocência é loucura. Uma fronte sem rugas
denota insensibilidade. Aquele que ri
ainda não recebeu a terrível notícia
que está para chegar.
Bertold Brecht
        A conjuntura em que vivemos é certamente a mais adversa desde os tempos da ditadura militar (1964-1985). A atual composição do congresso nacional se caracteriza pela inépcia, a corrupção e o reacionarismo extremos. Este congresso é galvanizado pelo obscurantismo insuperável das bancadas Boi/Bíblia/Bala/Jaula. O espúrio governo golpista de Michel Temer (PMDB/PSDB/PSD/PP/DEM/PR/PV/PTB/PPS) constitui o advento do governo direto, sem qualquer tipo de mediação, do mesmíssimo bloco de classes responsável pelo golpe militar (1º de abril de 1964), pela ditadura e pela transição política conservadora: donos de empreiteiras, bancos, oligopólios industriais, latifúndios/agronegócios, mineradoras e oligopólios midiáticos (encabeçados pela Folha de São Paulo e a Rede Globo). Soma-se ainda a hegemonia deletéria de todas as direitas, o protagonismo do fundamentalismo cristão e de protofascistas de todas as espécies, como Bolsonaro (ex-PSC em transição para o Patriota), Feliciano (PSC), Ronaldo Caiado (DEM) e companhia.
        Destacam-se os entusiastas da ditadura militar e aquela bizarra juventude ultraneoliberal que se organiza em grupos como o Movimento Brasil Livre (MBL), o Avança Brasil et caterva. Não percamos de vista que quem lidera o MBL são os arrivistas Fernando Holiday (vereador de São Paulo pelo DEM) e Kim Kataguiri e quem registrou a patente – sendo, portanto, o dono da marca – é Alexandre Frota, ícone do machismo, da LGBTfobia, pregador do estupro, entusiasta da ditadura, astro especialista em sexo explícito.
        A atual política de desmonte dos direitos impetrada pelo governo Temer constitui retrocesso secular: as ditas reformas trabalhista e previdenciária e o obsceno congelamento dos gastos públicos por 20 anos (Emenda Constitucional 95, de 15/12/2016, a emenda do fim do mundo) desferiram golpe fatal contra os(as) trabalhadores(as) e o sistema público de saúde, seguridade social e educação. Trata-se de aumento exponencial da exploração e da opressão, as quais atingem os níveis do início do século passado.
        O país se consolida no pódio como um dos campeoníssimos mundiais em graves violações dos direitos humanos, em concentração de renda e desigualdade social. Temos a quarta população carcerária mundial – maioria absoluta de negros e pobres. Temos a quinta população carcerária feminina. O genocídio do Povo Negro é sistêmico. O racismo é institucional. O governo e o latifúndio/agronegócio praticam também política de extermínio contra os Povos Indígenas, os(as) Quilombolas e os(as) trabalhadores(as) do campo.  A polícia militar brasileira é a que mais mata entre todas as polícias do planeta. A tortura e o desaparecimento forçado continuam a ser sólidas instituições por aqui. As chacinas periódicas praticadas pelo aparato repressivo – no atacado e no varejo – adquirem sistematicidade assustadora. Como se não bastasse, as Forças Armadas são chamadas a reprimir manifestações e a ocupar ruas, cidades, morros e favelas.
        Para completar o quadro, o Brasil é o campeão mundial de crimes contra LGBTs: foram 343 mortes em 2016, uma a cada 25 horas. O país ocupa a quinta posição no ranking global de feminicídio. A situação não é melhor quanto ao número de estupros: segundo dados oficiais, há um estupro a cada 11 minutos e 10 estupros coletivos por dia.  Sabe-se que há subnotificação de pelo menos 30% nesses dados. A tragédia é, portanto, ainda maior.
        O famigerado ovo da serpente shakespeariano/bergmaniano já está fecundo. A defesa explícita da intervenção militar vinda da hierarquia das Forças Armadas é um dos sinais mais eloquentes. As investidas parlamentares e governamentais que levaram à interdição de manifestações artísticas e as tentativas sistemáticas de fazer censura com as próprias mãos por parte do fundamentalismo cristão arrematam o processo. Estão em pauta - além da intervenção militar e do esbulho dos direitos dos(as) trabalhadores(as) - a criminalização da criatividade e do dissenso, a guetização das questões LGBTs, a Escola sem Partido, a cura gay, a aniquilação das religiões de matriz africana. Senão, vejamos.
        No dia 15/09/2017, o general Antônio Hamilton Martins Mourão, em palestra em um clube maçônico de Brasília, pregou abertamente a intervenção militar imediata dizendo: “... a minha visão coincide com a dos companheiros que estão no alto comando do exército”. O general Antônio Mourão está na ativa e ocupa o alto cargo de Secretário de Economia e Finança do Exército. Incontinenti, ele foi contemplado pelo entusiasmo histérico de Jair Bolsonaro. Em seguida, foi respaldado e reforçado por ninguém menos que o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, e pela Procuradoria Geral da Justiça Militar. Em 19/09, o general Villas Bôas declarou com a maior desfaçatez: “A possibilidade de intervenções militares ocorre permanentemente, [já que] as Forças Armadas têm mandato para fazer na iminência de um caos”. Trata-se de interpretação selvagem do nefasto artigo 142 da Constituição Federal, o qual atribui às Forças Armadas – que, sabemos, são golpistas por tradição e definição - “a defesa da Pátria, a garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem” (?????). Aí veio o general Edson Leal Pujol (26/09) que, em palestra a empresários na Associação Comercial de Porto Alegre, incitou “as pessoas insatisfeitas a se manifestarem nas ruas”. O general Pujol almeja, certamente, reedição das infames Marchas da Família com Deus pela Liberdade (19/03/1964 e 08/06/1964), manifestações públicas organizadas com o objetivo precípuo de criar as condições imediatas para o golpe de 1964 e apoiá-lo depois de sua consecução. No dia 28/09/2017, apareceu em Brasília um banner gigante em homenagem ao general Mourão, erguido por guindaste. Desnecessário dizer que o Ministro da Defesa, Raul Jungmann (PPS) tem se mantido calado e submisso aos seus superiores militares.  Mais emblemático ainda é o fato de que a declaração golpista do general Mourão foi dada logo depois de um sinistro Encontro do Alto Comando do Exército em Brasília (11/09) que reuniu seis generais quatro estrelas e a totalidade dos comandantes militares. Pauta: a necessidade de tomada de posição efetiva (leia-se intervenção) dos militares no cenário político brasileiro.  Os três generais citados neste parágrafo estavam presentes.
        Enquanto isto, acontecem os maiores descalabros de norte a sul do Brasil. Em 10/09/2017,   a exposição  Queermuseu, Cartografias da Diferença na Arte Brasileira, foi cancelada em Porto Alegre/RS pelo Banco Santander a partir de pressões das redes sociais sempre comandadas pelo MBL e fundamentalistas de todos os matizes. Esta exposição mostra obras consagradas de artistas como Portinari, Volpi, Pedro Américo, Lygia Clark, Adriana Varejão, Bia Leite. Mais recentemente (01/10), o prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella (PRB) vetou a realização da mesma exposição no Museu de Arte do Rio/MAR dizendo que, por conta dele, esta exposição seria jogada no fundo do mar (sic).
        Em 14/09/2017, por iniciativa dos deputados Paulo Siufi (PMDB), Herculano Borges (Solidariedade) e Coronel Davi (PSC), a obra-denúncia intitulada Pedofilia, de Alessandra Cunha, foi apreendida pela Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente no Museu de Arte Contemporânea de Campo Grande/MS. Os deputados exigiam ainda que a artista fosse incluída no cadastro estadual de pedófilos, o que obviamente, não aconteceu. A obra de arte voltou para o museu no dia 16/09 sob a classificação de 18 anos.
        Em 15/09/2017, certo juiz chamado Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª Vara do Distrito Federal, concede liminar que libera a realização de pseudoterapias de reversão sexual (leia-se cura gay). Desde março de 1999, o Conselho Federal de Psicologia/CFP erradicou esta prática (resolução 01/99). Tal liminar atende parcialmente a ação movida contra o CFP pela psicóloga (?) e missionária evangélica fundamentalista Rosângela Alves Justino. Agora fortalecida, ela lidera cruzada contra as medidas progressistas e a política de direitos humanos do CFP.
         Em 22/09/2017, o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PHS), bane por decreto (Decreto 16 717/2017) políticas de combate à discriminação de gênero nas escolas municipais da cidade. Suprime as palavras gênero e diversidade sexual do plano de trabalho da Secretaria Municipal de Educação. Tudo isto por pressão da Bancada Cristã, liderada pelo vereador Jair di Gregório (PP). Além disso, tramita na Câmara Municipal de Belo Horizonte, também patrocinado pela Bancada Cristã, projeto de lei (PL 274, de 12/07/2017), que visa a implantação da Escola Sem Partido, assinado por 26 dos 41 vereadores desta bancada. Tal projeto é rejeitado radicalmente por significativa parcela de estudantes, professores(as) e da comunidade escolar. Na semana passada foi rejeitado por unanimidade pela Comissão de Educação, mas sua tramitação em primeiro turno prossegue.
        Em 26/09/2017, a performance de abertura do 35º Panorama da Arte Brasileira  no Museu de Arte Moderna/MAM de São Paulo sofreu investidas reacionárias do aparato midiático, das redes sociais, de Bolsonaro e do Avança Brasil. Esta performance evoca a obra La bête (O bicho), de Lygia Clark. O Ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão corrobora a censura ao MAM em reunião com a Bancada da Bíblia da Câmara Federal liderada pelo deputado Sóstenes Cavalcante (DEM). O prefeito João Dória (PSDB), espécie de Bolsonaro gourmetizado, e o governador Geraldo Opus Dei Alkmin (PSDB), cada um a seu modo, reforçaram a censura à exposição. É caso de indignação, mas não de surpresa: ao tomar posse, em janeiro deste ano, Dória aniquilou os grafites e pichações das ruas de São Paulo e desencadeou política agressiva de privatização do espaço público e de repressão, criminalização e segregação dos usuários de crack.
        Em 03/10/2017, começa a tramitar na Câmara Federal projeto de lei (PL 8615/17) que visa proibir a profanação de símbolos religiosos (sic) em shows, exposições, espetáculos, apresentações circenses, peças, filmes, músicas, games – ao vivo e em todos os suportes – e garantir classificação indicativa. Esta iniciativa abre ainda mais espaço aos crimes de ódio contra as religiões de matriz africana, demonizadas pelos fundamentalistas.  Só em Nova Iguaçu, nos últimos meses, sete terreiros e centros foram depredados. O projeto de lei é de iniciativa do indefectível pastor Marco Feliciano (PSC), que o apresentou em 19/09, sempre em nome da moral e dos bons costumes. Tal medida remete à política funesta de censura prévia da ditadura militar e lembra o Parenthal Advisory, etiqueta introduzida nos Estados Unidos pela Recording Association of America (1985) e, na Inglaterra, pela British Phonographic Industry (2011). Seus alvos preferenciais são o rock, bandas de metal, punk, hardcore e música negra como o funk, o hip-hop e rap.
        Voltando a Belo Horizonte: em 04/10/2017, o deputado estadual João Leite (PSDB) - candidato derrotado à prefeitura da cidade, mistura indigesta de conservadorismo tucano com fundamentalismo evangélico - investe contra a exposição Faça você mesmo sua Capela Sistina, de Pedro Moraleida (1977-1999). Nesta investida, João Leite faz dobradinha com o já citado Jair di Gregorio, vereador do PP. Este tem mobilizado a Assembleia de Deus da qual é liderança. Ele se autoproclamou “o defensor das famílias de Belo Horizonte”. Os dois parlamentares deram a deixa para uma onda de manifestações fascistas na porta do Palácio das Artes, local da exposição. Chegou-se ao absurdo da detenção pela PM do jovem pedreiro negro Arlee Douglas Rosa (23 anos), que se manifestava a favor da exposição. Arlee foi acusado de... racismo pelo evangélico Ronan Ferreira (25 anos). Quem deu voz de prisão foi o pastor Leonardo Alvim de Melo da Comunidade Evangélica Projeto Viver. Mobilizações de resistência também estão ocorrendo diariamente. Nesta segunda-feira (09/10), acontece uma grande manifestação de repúdio a esta pavorosa escalada reacionária. Em dezembro de 2011, ano da morte de D. Helena Greco, o Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania realizou pequena mostra independente de obras de Pedro Moraleida como parte da programação Semana Internacional de Direitos Humanos – Casa D. Helena Greco: Espaço de Resistência.
        João Leite e Jair di Gregorio investiram também contra a apresentação em BH da peça O Evangelho segundo Jesus, Rainha do Céu, encenada na FUNARTE como parte da Ocupação Transarte, de 05/10 a 08/10. Em setembro, a peça foi proibida por liminar em Jundiaí/SP. A liminar foi cassada em 03/10. Trata-se de monólogo da trans escocesa Jo Clifford, protagonizado pela atriz trans Renata Carvalho. A peça foi encenada em BH sem problemas e com sucesso em 2016.
        Em 06/10/2017, no Rio de Janeiro, a prefeitura Marcelo Crivella interdita o Castelinho de Ipanema impedindo a estreia da Exposição Curto Circuito e das peças Bicha Oca e Nascituros. A Ocupação Oduvaldo Vianna Filho denuncia o sumiço de algumas obras da mostra e tentativa flagrante de criminalizar e guetizar a pauta LGBT, além da criação de preconceitos e disseminação do ódio.
        Aí está um terrível inventário – que não é exaustivo - da escalada do processo de fascistização em curso. Repudiemos alianças com as direitas. À política de terra arrasada dos protofascistas de todos os matizes e às suas pretensões totalitárias nos cabe contrapor um acúmulo que resgate um repertório radical de lutas anticapitalistas, classistas, independentes e emancipatórias. Só assim será possível erradicar as condições favoráveis à eclosão do ovo da serpente: precisamos destruí-las para que a serpente do fascismo cesse de proliferar.     

Liberdade de manifestação e expressão!
Censura Nunca Mais!
Ditadura militar Nunca Mais!
NÃO PASSARÃO!
Belo Horizonte, 9 de outubro de 2017
INSTITUTO HELENA GRECO DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA
Não Passarão!!!

Um comentário:

  1. Excelente nota de repúdio, trazendo um resumo dos últimos e absurdos acontecimentos! Sigamos contra o cerceamento à liberdade de expressão! Censura nunca mais! Não passarão!
    Abraço fraterno!
    Alice

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