NOTA DE REPÚDIO À CONDENAÇÃO DOS 23 ATIVISTAS
DAS JORNADAS DE LUTA DE 2013/2014
O Instituto
Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania vem a público manifestar o mais veemente
repúdio à condenação dos 23 ativistas das Jornadas de Junho de 2013 e das lutas
anticopa de 2014. Tal condenação está inserida na escalada da violência
policial/militar/jurídico-legislativa que tem como um dos principais
dispositivos a lei antiterrorismo (Lei 13 620, de 16 de março de 2016), fabricada
com o objetivo precípuo de combater as lutas das/os trabalhadoras/os e dos
movimentos sociais. A criminalização destas lutas e a tentativa de aniquilá-las
estão na base do terrorismo de Estado em vigor.
No dia
17 de julho, o juiz Flávio Itabaiana de Oliveira (27ª Vara Criminal), do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, condenou os 23 a sete anos de prisão em
regime fechado. Este Flávio Itabaiana, cuja família tem ligação com a ditadura
militar (1964-1985), exerce há anos perseguição implacável à luta combativa dos
manifestantes: foi ele que emitiu dezenas de mandados de prisão profilática na
véspera da abertura da Copa do Mundo no Rio, em 2014. Além da ausência de
provas e da interdição à ampla defesa, este processo é eivado de arbitrariedades:
ilegalidade e abusos nas prisões, nas invasões de domicílio, nas buscas e
apreensões em residências; infiltrações, monitoramento e grampos (inclusive
contra os advogados das vítimas); espancamentos e tratamentos degradantes
contra os indiciados. Desnecessário acrescentar que a mídia corporativista burguesa
- sobretudo a Rede Globo - mais uma vez tem atuado como caixa de ressonância de
toda esta aberração.
Os 23
ativistas – estudantes, professoras/os, trabalhadoras/os - foram condenados
pelo fato de exercerem direitos humanos fundamentais: liberdade de manifestação
e liberdade de expressão. Lutaram por melhores condições de vida e trabalho; por
educação e saúde públicas de qualidade; contra o aumento das passagens de
ônibus e pelo passe livre; contra a farra da FIFA; contra a expulsão das/os
moradoras/es de suas casas por conta das obras da Copa; contra o despejo da
Aldeia Maracanã; contra o governo espúrio Sérgio Cabral (MDB); pela liberdade
de Rafael Braga (preso por porte de material de limpeza) e de todas/os presas/as
políticas/os; contra as invasões policiais e militares nos morros e favelas; contra
as UPPs. Uma das lutas principais foi a denúncia da execução sob tortura do ajudante
de pedreiro Amarildo de Souza pela UPP da Rocinha - Amarildo continua desaparecido.
Para o
Estado, bem na lógica da Doutrina de Segurança Nacional, os 23 ativistas
condenados são seus inimigos internos.
É um Estado que pratica o encarceramento em massa, a guerra generalizada contra
os pobres e o genocídio contra o Povo Negro e Povos Indígenas. Um Estado que
tem levado a exploração e a opressão às máximas consequências, no qual a
tortura, o extermínio e o desaparecimento forçado permanecem como sólidas
instituições. Este Estado tem a polícia que mais mata, entre todas do planeta.
Os 23,
assim como milhões de pessoas que participaram das belas Jornadas de Junho
(2013) e das manifestações anticopa (2014), lutavam e lutam justamente contra
este processo de fascistização descrito acima. Saudamos fortemente esta luta e
manifestamos apoio e solidariedade incondicionais às/aos companheiras/os. Como
dizem os 23:
“Não é só
pelos 23: é por todos que lutam!”
- PELA EXTINÇÃO
DOS PROCESSOS CONTRA OS 23!
- ABAIXO O
TERRORISMO DE ESTADO! PELO FIM DO APARATO REPRESSIVO!
- PELA LIBERDADE
DE MANIFESTAÇÃO E EXPRESSÃO! PELO FIM DAS PERSEGUIÇÕES!
- TODO APOIO E
SOLIDARIEDADE AOS 23! VIVA A LUTA DAS JORNADAS DE JUNHO/2013 E ANTICOPA/2014!
Belo Horizonte, 21 de julho de 2018
Instituto
Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania
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Reproduzimos abaixo a nota assinada por 13 dos 23 ativistas:
Nota de repúdio e de chamamento à luta
- Assinam esta nota 13 dos 23 ativistas condenados pelos protestos no Rio -
Ontem, 17/07, o juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau finalmente entregou o serviço para o qual foi escalado por Sérgio Cabral há quatro anos atrás: condenou todos os 23 ativistas envolvidos nos protestos contra a farra da FIFA a penas que vão de 5 a 13 anos de prisão, em regime inicialmente fechado.
Quais crimes nós cometemos?
Ousamos denunciar os desmandos de Sérgio Cabral, Pezão & CIA, acobertados todo o tempo por parte do Poder Judiciário e do Ministério Público do Rio?
Ousamos denunciar a farra da Copa da FIFA, cujo único “legado” que restou para o povo foram os escombros das comunidades removidas e a quebradeira dos serviços públicos?
Ousamos participar, como estudantes e trabalhadores, ombro a ombro com milhões de pessoas nas maiores manifestações de massas da história recente do país?
Ousamos atuar ao lado de movimentos populares independentes, que não se curvam ou se vendem às “tenebrosas transações” da politicalha oficial que nos desgoverna, cujos maiores símbolos são Pezão e Temer?
Se disso nos acusam, temos que aceitar com orgulho o que dizem os nossos algozes. Porque foi isso mesmo que fizemos, ou seja, lutamos. Todos precisam compreender que é a toda nossa geração que buscam condenar e intimidar com esta sentença infame. Mas não conseguirão: carregamos a teimosia própria dos que insistem em ter fé na vida, fé na luta, fé no povo. A teimosia dos milhares que marcharam na Praça Saens Peña, no dia da final da Copa do Mundo, apenas algumas horas depois que dezenas de ativistas foram presos e enviados para Bangu. Nós temos lado, e este não é o lado da casa grande. Se disso nos acusam, muito obrigado, pois.
Com esta sentença, o Sr. Itabaiana entra para a história pela porta dos fundos. Será sempre lembrado como aquele que perseguiu de modo implacável a juventude de junho de 2013. Que fique registrado: o que se fez no Rio de Janeiro, quanto aos procedimentos persecutórios, prisões abusivas, invasões de residências, infiltração ilegal, grampos de advogados a até uma “delação premiada informal” (a do sabujo Felipe Braz, cujo depoimento é praticamente a única “prova” apresentada para nos condenar) não teve par em nenhum outro lugar do Brasil. Talvez os carrascos se orgulhem do seu serviço; a esse “orgulho” nós achamos mais coerente chamar: VERGONHA!
Sim, porque é vergonhoso que os manifestantes contra a farra da FIFA sejam condenados, quando hoje grande parte dos próprios organizadores da Copa estão presos! Quando o ex-governador que nos reprimiu com selvageria está preso! Quando o país é levado à beira da fome e da devastação social pelos mesmos vampiros que tremeram de ódio quando a juventude tomou as ruas! Quando a Rede Globo, que nos perseguiu, ainda não explicou as suas negociatas em torno dos megaeventos!
Alguma palavra sobre a “conduta reprovável” e “personalidade distorcida” dessas pessoas, senhor juiz?
Reafirmamos o que dissemos ao longo de todos estes anos: LUTAR NÃO É CRIME! Crime é o estado de calamidade oferecido ao povo na fila dos hospitais, crime é a falta de vaga nas creches, crime são os ônibus caros e superlotados, crime é o que se pratica diariamente nas favelas, ensanguentadas pelo genocídio do povo preto e pobre. Isto é crime! E estes crimes, tenham certeza, não ficarão impunes para sempre.
Em tempos de sérios ataques aos direitos trabalhistas e sociais, é fundamental desfraldar bem alto as bandeiras da liberdade de expressão e de manifestação, sem as quais nenhum outro direito pode ser defendido, muito menos conquistado. Isso é ainda mais importante quando o Rio se vê sob uma intervenção militar, e assistimos quase diariamente oficiais discursando abertamente sobre a possibilidade de um golpe militar no país. Conclamamos todos/as os/as lutadores/as, trabalhadores/as, estudantes, coletivos, ativistas, intelectuais e democratas a se manifestarem nessa campanha. Não é só pelos 23: é por todos os que lutam!
Lutar não é crime!
Fascistas, hoje e sempre: não passarão!
Viva as jornadas de junho de 2013!
Assinam esta nota:
Bruno de Sousa Vieira Machado
Elisa Quadros Pinto Sanzi
Emerson Raphael Oliveira da Fonseca
Felipe Frieb de Carvalho
Filipe Proença de Carvalho Moraes
Igor Mendes da Silva
Joseane Maria Araújo de Freitas
Leonardo Fortini Baroni
Luiz Carlos Rendeiro Júnior
Pedro Guilherme Mascarenhas Freire
Rafael Rêgo Barros Caruso
Rebeca Martins de Souza
Shirlene Feitoza da Fonseca
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ABAIXO-ASSINADO DE APOIO E SOLIDARIEDADE A PEDRO
GUILHERME MASCARENHAS FREIRE, EX-ALUNO DO PROGRAMA
DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS (CIÊNCIA DA LITERATURA),
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO, E AOS
OUTROS 22 CONDENADOS PELO JUIZ FLÁVIO ITABAIANA:
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Reproduzimos abaixo a nota de Pedro Guilherme Mascarenhas Freire:
Condenados a 7 anos de prisão para calar as ruas
Sou um dos 23 e o juiz Flávio Itabaiana acaba de nos condenar a 7 anos de prisão. Condenou 23 militantes por participarem das grandes manifestações de 2013 e 2014 contra o governo corrupto de Sérgio Cabral e sua ligação criminosa com os empresários de ônibus, contra a expulsão forçada de milhares de pessoas de suas casas para a realização "das obras da copa", contra o despejo da Aldeia Maracanã e o genocídio nas favelas gritando - "onde está o Amarildo?" -, em defesa da educação pública, da saúde pública, da vida. Por estas pautas e lutas fomos condenados pelos crimes de "associação criminosa" (Art. 288) e "corrupção de menores" (Art. 69).
Confesso que não iria me manifestar agora, não por achar desnecessário, mas por faltar dias para o nascimento de nossa filha, Alice, e gostaríamos de nos concentrar na sua vinda. Minha companheira fará amanhã 39 semanas, 9 meses e 3 semanas de gestação. Parece que tudo nos tira o foco dela e de sua chegada, sempre. As crianças também estão no recesso, assim como eu, e parar para escrever assim é quase fantasia. Uma bebê no braço e o outro escrevendo, os olhos lendo também as várias mensagens carinhosas de apoio que estamos recebendo.
Mas, verdade, é imprescindível. Precisamos expor toda essa mentira que é este processo com provas inventadas, sem qualquer materialidade, que chegou a investigar o anarquista russo Mikhail Bakunin, morto no século XIX, como um dos participantes das manifestações de Junho de 2013. A base desse processo são argumentos e mentiras grotescas! Ontem e hoje, a emissora Globo repetiu o podre delírio de que "planejávamos explodir o Maracanã na final da Copa". Explodir com quais armas? Com os livros e blusas, máscaras de gás, encontradas nas casas dos presos e perseguidos no dia 12 de Julho de 2014? São mentiras tão fracas que só são levadas a sério pela justiça pois ela é essa injustiça de Estado que conhecemos.
Flávio Itabaiana vem de uma família conhecida por sua atuação no judiciário durante a ditadura militar. O que ele faz hoje é reproduzir modelos de condenação, invenção de inimigos públicos da sociedade, de fatos, todos com a única finalidade de calar pessoas e movimentos.
Não somos criminosos. Trabalho na rede pública e particular de ensino, 40h por semana. Sou pai e padrasto. Militante de movimentos sociais e vou assumir em Agosto a direção do SEPE pela regional I. Não ando e não andamos com bombas para atirar em "crianças indefesas". Não nos encaixamos na imagem falsa do terrorista que "os donos do poder" sempre criaram.
Somos da luta, estamos na luta e certamente venceremos.
Fonte:
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Reproduzimos abaixo a nota do advogado Mariano D Icarahy:
O ESTADO POLICIAL E FASCISTA CONDENA OS JOVENS INJUSTAMENTE PRESOS PRESOS NA COPA DE 2014
Numa sentença genérica como a acusação, eivada de ilegalidades, que atinge frontalmente a proporcionalidade e a razoabilidade, o direito de ampla defesa e do contraditório, sujeita a embargos e outros recursos, o Juízo da 27ª Vara Criminal da Capital-RJ condenou a juventude combatente de 2013/14 a penas que variam de 5 a 13 anos de reclusão, em regime fechado, mas com direito a apelarem em liberdade.
A sentença não individualiza a pena aplicada por cada conduta criminalizada, de modo a ser aferida a dosimetria da pena, ou seja, ao invés de dizer tanto por associação criminosa e tanto por corrupção de menores, diz que, pelos dois crimes, o total, por exemplo, é de 7 anos.
Além do mais, quanto ao crime de corrupção de menores, entendemos que a sentença é nula, pois, não houve instrução, ou seja, não houve a produção de prova de acusação nem de defesa, não houve, por exemplo, a oitiva de testemunhas de acusação e de defesa. Além disso, essa acusação, não constava da denúncia inicial. Foi acrescida pela promotoria em alegações finais, fora do prazo que o MP tinha para fazê-lo, e, sem o direito de ampla defesa e do contraditório. O rito processual para esse acréscimo da acusação foi totalmente descumprido.
Esse requinte de maldade do Estado se deveu a um manifesto interesse de agravar a pena dos jovens para atingir um patamar maior que quatro, que seis, e que oito anos, para tentar "justificar" as suas prisões em caso de condenação em segunda instância, caso o STF não mude o seu entendimento até lá, o que também consideramos improvável.
Tudo isso e muito mais pode ser dito, criticado e rebatido com relação a essa sentença, inclusive o fato do Juiz condenar 5 acusados para os quais o MP pediu a absolvição. O juiz não é detentor da ação penal. É o Ministério Público que detém a competência para propor a ação penal. E ele pediu a absolvição. Se não há pedido de condenação, o juiz julgou além do pedido, mas, o que interessa de verdade, é que essa condenação é política e extemporânea.
O Juiz demorou quase três anos para dar a sentença, sem nenhuma justifica para a demora, o que contraria o devido processo legal, por violar o tempo razoável para o processo. Isso também será profundamente questionado pela defesa.
Aqueles que foram alvos das manifestações e das denúncias dos protestos estão todos envolvidos nas falcatruas que já levaram muitos deles para a mesma prisão que comandaram contra os jovens atingidos por esses e outros processos.
Essa juventude, que, enfrentando a violência policial do Estado, foi para as ruas para mudar o País, ao invés de ser criminalizada, deveria ser exaltada por sua bravura e clarividência política. Eles apontaram para os alvos corretos. O País não é nem voltará a ser o mesmo de antes de 2013/14. Nem aquela juventude, nem nós, mais velhos, naquela altura tínhamos a verdadeira dimensão do volume e da grandeza dos interesses que estávamos contrariando naqueles tempos de intensa luta política. Só para dar um exemplo, com relação ao Cabral, ele era um dos alvos principais, entretanto, ninguém tinha sequer uma noção do gigantismo das cifras e dos interesses envolvidos pela corrupção generalizada que se espalhou pelos aparelhos de Estado, em todos os níveis da Federação.
Mesmo com todas as abordagens jurídicas que fizemos de pronto aqui e de muitas outras que se pode fazer, dos recursos cabíveis, o correto é deixar claro que essa luta, no seu âmago, não é jurídica, e não se resolve exclusivamente no Judiciário. Ela é uma questão eminentemente política que exige, inclusive, o devido enfrentamento político, com a mobilização de todos os envolvidos, direta ou indiretamente, o que quer dizer de toda militância combativa, independente e classista, e dos setores verdadeiramente democráticos.
Essa decisão tem que ser repudiada pelos movimentos sociais, que sofrem como um todo o processo de criminalização imposto pelo Estado contra a insurgência política, pelos juristas progressistas, pelos advogados populares, por todos aqueles que têm compromisso com a defesa dos direitos de livre expressão, de opinião, de manifestação, de rebelião popular, de revolução.
Só uma transformação radical do sistema vigente pode abrir o caminho do povo para sua libertação do jugo desse Velho Estado burguês-latifundiário, submisso aos interesses do imperialismo, de caráter policial e fascista.
LUTAR NÃO É CRIME!
PELA EXTINÇÃO DOS PROCESSOS POLÍTICOS, NO CAMPO E NAS CIDADES!
VIVA A JUVENTUDE COMBATENTE!
NADA DETERÁ A CHEGADA DA PRIMAVERA!
Fonte:
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