"Estamos aqui pela Humanidade!" Comuna de Paris, 1871 - "Sejamos realistas, exijamos o impossível." Maio de 68

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Reuniões abertas aos sábados, às 16H - militância desde 2003.

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

REALIZADA A SEÇÃO "CIDADE E MEMÓRIA"

NOTÍCIA SOBRE A SEÇÃO CIDADE E MEMÓRIA – documentários e roda de conversa sobre ditadura e a Luta Antimanicomial
    Realizada no dia 30/08/2018, a seção Cidade e Memória da programação Cidade em Movimento da 12ª Cine BH (Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte). Aconteceu no Cine Sesc Palladium em Belo Horizonte/MG. "Cidade e Memória traz filmes produzidos por novos cineastas de Belo Horizonte sobre fatos históricos ocorridos no Brasil e América Latina, além de filmes que trazem marcas que a nossa cidade ainda carrega sobre os tempos da ditadura e das instituições manicomiais. Contra a ditadura e contra os manicômios, contra tudo que aprisiona e cerceia o livre direito de ir e vir, a sessão é uma resposta da cidade para os tempos sombrios que estamos vivendo”.       
        Nesta seção foram exibidos os seguintes documentários:
Vídeo - Carta (Priscila Musa);
Memória Essencial (Luciene Araújo e Ceres Canedo);
Serra Verde (Luciene Araújo);
Arara: Um filme sobre um filme sobrevivente (Lipe Canêdo).
      Após a exibição dos documentários houve roda de conversa com explanações dos diretores Priscila Musa, Luciene Araújo e Lipe Canêdo e da convidada Heloisa Greco (Bizoca), membro do Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania. A curadora da mostra Cidade em Movimento, Paula Kimo, fez a mediação.
         A roda de conversa abordou o making of dos filmes e seus temas: as marcas renitentes da ditadura militar e dos manicômios na cidade; a persistência da estratégia do esquecimento e do terrorismo de Estado; a luta contra esta situação de barbárie.
       Destacamos a participação de Maria de Fátima e Júlio (irmãos de Paulo Roberto Pereira Marques) e Valéria Costa Couto (irmã de Walquíria Afonso Costa) - familiares de guerrilheiras/os, desaparecidos políticos no Araguaia. Estiveram presentes também militantes de movimentos sociais, estudantes, usuárias/os e trabalhadoras/es em saúde mental. Agradecemos o convite e a presença de todas e todos.
         A seguir, a nossa contribuição na roda de conversa:
       A partir dos documentários exibidos, nossas reflexões giram em torno de duas questões inseparáveis que se retroalimentam as quais, a nosso ver, estão na centralidade e, ao mesmo tempo, transversalizam os quatro documentários exibidos. São elas: a estratégia do esquecimento enquanto política de Estado e a construção da cultura repressiva no Brasil sob o signo do aniquilamento e da obliteração. Trata-se da brasilidade excludente (Henrique Samet) – processo histórico de longa duração.
        Ambas foram levadas às máximas consequências durante a ditadura militar (1964-1985). Ambas seguem seu curso nestes tempos sombrios atuais sob a égide do pessimamente chamado Estado democrático de direito – Estado penal que se explicita cada vez mais como Estado policial/parafascista. O processo que muitos, inadvertidamente, chamam de redemocratização não passa de normalização defeituosa (Irene Cardoso) ou normalização da exceção brasileira/um estado de emergência permanente (Paulo Arantes): “os instrumentos do Terror de Estado não podem ser desinventados”, (...) “a democracia assim engendrada é tão punitiva quanto”, arremata ele. Como diz Tales Ab’Saber em emblemática tautologia: “O que resta da ditadura? Tudo, menos a ditadura, é claro”.
    Os quatro documentários tratam de instituições extremamente longevas fortíssimas no Brasil: o controle da memória pelo Estado; o encarceramento em massa; a tortura; o desaparecimento forçado; a segregação das classes perigosas/classes torturáveis; o racismo, o extermínio e o genocídio sistêmico dos Povos Originários.
   Além da relevância e da urgência dos temas abordados nos documentários, quero destacar também a sensibilidade e a precisão da curadoria. Os quatro filmes estabelecem interlocução orgânica e expressiva entre si. Podem ser tomados como quase um filme de montagem. De tal modo que, vistos simultaneamente, levam à urdidura de uma narrativa que nos revela uma panorâmica do processo de construção da cultura repressiva no Brasil.
  Somos levados a constatar também a complicada oposição instituído/instituinte. Ou seja: o protagonismo – mas também as limitações e a atomização – dos movimentos sociais e dos sujeitos que lutam contra a opressão procurando fazer a coisa avançar e o poder instituído travando, confundindo, enquadrando, distorcendo, destruindo, aniquilando.
    Há ainda a dialética passado/presente – aquele passado que nem sequer é passado e que nos cerca de todos os lados, “o passado que nos fez” (Caio Prado Júnior): as permanências que caracterizam a situação de barbárie vigente.
     Exploramos a seguir um pouco em cada um dos quatro documentários as duas questões propostas na roda de conversa: a estratégia do esquecimento enquanto política de Estado e a escalada do processo de construção da cultura repressiva.
1) MEMÓRIA ESSENCIAL (Luciene Araújo e Ceres Canedo)
     Começamos por este porque é aquele que nós, do Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania, conhecemos há mais tempo. Tivemos a oportunidade de acompanhar, digamos, a sua gestação.
      Quanto às fontes: o filme começa com o áudio da audiência pública da Corte Interamericana de Direitos Humanos (20 e 21 de maio 2010). A sentença, a primeira a condenar o Brasil por crimes cometidos pela ditadura, é de 24 de novembro de 2010 (Caso Gomes Lund e outros versus Brasil). Em julho de 2018 houve outra condenação importantíssima: a do caso Vladimir Herzog onde a Corte Interamericana de Direitos Humanos afirma explicitamente que a ditadura militar cometeu crimes contra a humanidade. O documentário trabalha também com alguns documentos como a publicação da Lei 9140/ 1995 (o Estado assume a responsabilidade por mortes e desaparecimentos e estabelece indenizações para os familiares das vítimas), recortes de jornais, fotos. Trabalha sobretudo com  fontes orais.
       São as fontes orais que dão o tom do documentário. Os depoimentos de Maria de Fátima (irmã de Paulo Roberto Pereira Marques) e Valéria Costa Couto (irmã de Walquíria Afonso Costa) são extremamente eloquentes. Dão conta da terrível realidade da saga dos familiares dos desaparecidos políticos na Guerrilha do Araguaia (1972-1975) e dos movimentos que lutam por memória, verdade e justiça em busca dos restos mortais das/os guerrilheiras/os.  Afirmam, com muita propriedade, que não se trata de questão familiar de caráter privado, mas de uma causa de toda a sociedade (“da nação”, como diz Valéria) – exigência de verdade, memória e justiça. Os depoimentos de Valéria e Maria de Fátima expressam a persistência inabalável da luta dos familiares.
       A guerrilha do Araguaia é um dos episódios mais emblemáticos do período da ditadura. Sua repressão é um dos casos mais escabrosos. Traz todos os elementos e dispositivos da estratégia do esquecimento e do terrorismo de Estado - essência da ditadura militar.
     A sentença condenatória da Corte Interamericana de Direitos humanos é fruto de uma peleja que vem se arrastando desde 1982 quando 22 familiares de 25 desaparecidos políticos iniciaram uma ação judicial de natureza civil contra o Estado perante a Primeira Vara Federal do Distrito Federal (Ação Ordinária 82.00.24682-5). A demanda dos familiares era a mesma: encontrar os restos mortais dos seus entes queridos. A União é condenada também neste processo: a sentença transitou em julgado em 2007. O Estado brasileiro tem se recusado terminantemente a executá-la.
  A causa demorou uma década e meia para chegar à Corte Interamericana de Direitos Humanos, uma vez foi encaminhada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 1995. Tudo isto graças, mais uma vez, à combatividade e persistência dos familiares. Ambas as sentenças – a interna e a internacional - têm sido mantidas na mais absoluta invisibilidade por parte do governo e da mídia corporativa, da mesma forma que o seu objeto o fora durante a ditadura. Esta mobilizou três campanhas envolvendo cerca de 20 mil militares das três armas para massacrar menos de 70 guerrilheiros e barbarizar a população local. Depois buscou obliterar a sua história e a sua memória a ponto de transformar o acontecimento em “desacontecimento” (Jacob Gorender).
      As Forças Armadas continuam a negar a existência de arquivos – alegam que eles foram incinerados com base no Decreto 79 099/1977. Estão determinadas, com o respaldo dos governos – de todos eles - a não dizer palavra sobre a Guerrilha do Araguaia. A Comissão Nacional da Verdade (CNV), cujo relatório final data de 10 de dezembro de 2014, não avançou um milímetro em nenhuma destas questões. Como, de resto, não avançou um centímetro no contencioso da ditadura militar. Continuam valendo os princípios programáticos da luta dos Comitês Brasileiros pela Anistia: nomeação, responsabilização e punição dos agentes da ditadura - eles praticaram crimes contra a humanidade, os quais são imprescritíveis, inanistiáveis e inafiançáveis; esclarecimento circunstanciado das torturas, mortes e desaparecimentos forçados; abertura irrestrita dos arquivos da repressão; solução para a questão dos desaparecidos; desmantelamento do aparato repressivo.
    Existe um agravante desolador entre os fatores que reforçam a estratégia do esquecimento, o qual envolve o espaço acadêmico. Trata-se de um tipo de revisionismo presente em certa historiografia – que não é hegemônica, mas não deixa de ser representativa – que incorpora a teoria dos dois demônios: direita e esquerda teriam sido igualmente responsáveis pelo golpe, ambas seriam refratárias à democracia.  Militares e militantes revolucionários teriam cometido iniquidades durante a ditadura militar, cada qual a seu modo, já que as duas partes pegaram em armas. Nesta lógica, os militares que praticaram crimes contra a humanidade – torturaram, estupraram, mutilaram, mataram e fizeram desaparecer corpos - devem ser anistiados completa e automaticamente.
      Fica evidente a desproporção do nivelamento do terrorismo de Estado com a violência revolucionária, como se a guerrilha tivesse prática idêntica à do aparato repressivo montado pela ditadura, que institucionalizou a prática de torturas, mortes e desaparecimentos.
    Comete-se confusão conceitual que leva à desqualificação do projeto revolucionário da esquerda. Trata-se do reducionismo de considerar a democracia burguesa como único projeto histórico legítimo e viável. As tentativas de testificação da existência de um pacto social que teria legitimado a ditadura e a inimputabilidades dos torturadores e assassinos de opositores estão presentes nesta historiografia revisionista. Alega-se que a ditadura foi apoiada por boa parte da sociedade. Omite-se que outra boa parte a repudiou e/ou combateu o tempo todo. Os movimentos sociais e as lutas contra a ditadura estão ausentes deste tipo de análise: há uma capitulação diante do que Walter Benjamin chama de história dos vencedores, aquela que tem como sujeitos exclusivos o Estado, a institucionalidade e as classes dominantes.
      Pois bem, esta historiografia revisionista acaba de dar espaço ao mais escabroso negacionismo com a aprovação na UnB de tese de doutorado(?) sobre a Guerrilha do Araguaia (com o título calhorda de Borboletas e Lobisomens) e sua recente publicação pela Editora Francisco Alves. Trata-se de mais uma afronta infame aos familiares de desaparecidos políticos na sua batalha por memória, verdade e justiça e sórdida agressão às guerrilheiras/os que tombaram na luta. O autor é um certo Hugo Studart. Ele reproduz em mais de 600 páginas a versão obscena dos porões da ditadura a partir de documentos aos quais só ele tem acesso - apócrifos, portanto. É flagrante a ocultação de fontes. Documentos repassados certamente pelo pai dele, o repressor Ten. Aviador Jonas Alves Correa que tinha alto posto de comando no Centro de informações de Segurança da Aeronáutica (CISA) durante o massacre da Guerrilha. Sinal destes tempos sombrios: obscurantismo cultural e acadêmico, deterioração/falsificação da pesquisa científica, aniquilamento da construção do conhecimento, fascistização da sociedade. Reforço, portanto da fabricação do desacontecimento e da tentativa de invisibilização da história.
2) ARARA: UM FILME SOBRE UM FILME SOBREVIVENTE (Lipe  Canêdo)
     Por falar em desacontecimento e invisibilização passemos ao  Arara: um filme sobre um filme sobrevivente. Um filme dentro do filme – fantástica metalinguagem que vem exatamente para dar visibilidade a uma das maiores iniquidades da ditadura de que se tem notícia. Talvez a maior delas, se é que é possível dimensionar/graduar a violência e o terrorismo de Estado.
        A invisibilidade dos Povos Originários começa pelo próprio nome coletivo pelo qual são designados (índio) – primeira violência simbólica, processo de ocultamento engendrado pelo colonizador. Os Povos Originários são os mais atingidos pela opressão/repressão em todo o período de apuração da Comissão Nacional da Verdade (CNV), de 1946 a 1988: opressão continuada – na verdade são mais de 500 anos de extermínio. De novo, a construção da brasilidade excludente.  Índio bom é índio integrado ou índio morto – é este o índio instituído como elemento definidor da nação.
        Arara (1970) - o filme de arquivo objeto do documentário exibido - é o registro da primeira formatura da Guarda Rural Indígena (GRIN) no Batalhão da PM Voluntários da Pátria, um Batalhão Escola de formação de soldados – um dos centros de tortura de Belo Horizonte durante a ditadura. As imagens de 1970 são de Gesco von Puttmaker. O curso destes formandos se deu de novembro de 1969 a janeiro de 1970. O filme foi exibido para Marcelo Zelic (Grupo Tortura Nunca Mais/SP) por Rodrigo Piquet no Museu do Índio, Rio de Janeiro, em 2012.
        Os Povos Originários sempre tiveram sua história, suas lutas, seus saberes, sua cultura invisibilizados e/ou demonizados. No Arara (1970) são expostos de forma escancarada ao desfilarem para uma festiva pequena multidão – inclusive crianças - e uma esfuziante bancada das mais altas autoridades estaduais e nacionais, composta por civis e militares. Os formandos exibem as técnicas de tortura aprendidas no curso – que incluem contenção e pau de arara. Trata-se do mais infame processo de naturalização do aviltamento, manifestação da banalidade do mal (Hannah Arendt). E a plateia aplaudindo e pedindo bis - como diria Gonzaguinha.
        O Relatório Figueiredo, também abordado no documentário, foi produzido em 1967-68 pelo procurador Jader Figueiredo Correia, encomendado pelo então ministro do interior Albuquerque Lima. Foi recuperado quase intacto em 2013 – estava depositado no Museu do Índio. Contém cerca de 7 mil páginas que trazem a essência da política indigenista praticada no Brasil: preação, escravização, caçadas humanas, chacinas no atacado e no varejo, extermínio, guerra química, inoculação de doenças, envenenamento, estupros sistemáticos, corrupção inominável, esbulho de terras e bens dos indígenas. Este relatório/testemunho sumiu convenientemente durante e depois da ditadura. Alegava-se que também teria sido incinerado.
        Em 1967, Fundação Nacional do Índio (FUNAI) substitui o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), criado em 1910 como Serviço de Proteção ao Índio e Localização de Trabalhadores Nacionais (leia-se, localização de servos, escravos e similares). O primeiro presidente da FUNAI, Queirós Campos, teve a infame ideia de criar a GRIN. Esta deveria formar numeroso pelotão de índios com a função precípua de reprimir índios e defender brancos civilizados, suas propriedades, seu Estado. Seu chefe era o capitão da Polícia Militar Manuel dos Santos Pinheiro. O treinamento – instrução policial e militar que incluía aulas de tortura - ficou a cargo do Batalhão Escola da Polícia Militar de Belo Horizonte. O gen. Oscar Gerônimo Bandeira de Mello, primeiro militar presidente da FUNAI (1970-74), foi um dos mais ferozes defensores das empresas de mineração e das empreiteiras. Donde foi também um dos mais ferozes repressores/exterminadores dos Povos Indígenas.
        Foi criado ainda o Reformatório Krenak, a única cadeia oficial para indígenas – verdadeiro campo de concentração – em Resplendor, Minas Gerais em reação à rebelião dos Maxacali de 1966. Outro campo de concentração para indígenas foi a Fazenda Guarani, instalada em propriedade da Polícia Militar de Minas Gerais no município de Carmésia. Além desses campos de concentração oficiais, havia inúmeros centros clandestinos – o principal, Icatu, é anterior ao Reformatório Krenak. Tais campos de concentração recebiam indígenas de várias etnias de todo o país, os quais foram ali presos, torturados e segregados – muitos morreram e desapareceram.
       Há um cálculo conservador que estabelece que quase 9 mil indígenas foram vítimas dos massacres perpetrados das mais diversas formas pela ditadura militar, que os transformou em inimigos internos a serem removidos por constituírem obstáculo ao seu projeto de desenvolvimento e segurança - repaginação do ordem e progresso positivista. Seus nomes, no entanto, não compõem lista alguma de mortos e desaparecidos. No relatório final da Comissão Nacional da Verdade, pela primeira vez um documento oficial do Estado aborda a questão, mas de maneira insuportavelmente lacunar, precária e, sobretudo, ineficaz: não há perspectiva de reparação ou anistia para os Povos Indígenas trucidados pela ditadura – não há o mínimo resgate da sua memória, verdade e justiça.  Eles não têm nomes, rostos, identidade, parentes, etnia, história. Manuel Pinheiro e os seus colegas torturadores e exterminadores de indígenas continuam a viver bem com uma aposentadoria bacana, como disse Paula Berbet no documentário.
        Muitos desses dados foram extraídos do relatório de Marcelo Zelic intitulado Comissão Nacional da Verdade e a questão indígena: a um passo da omissão, de 2014. Ele destaca duas questões reveladas pela criação da GRIN e pelo filme Arara (1970):
      - A perversidade sem limites de usar os indígenas para reprimir indígenas, fator de aviltamento, desagregação e trauma indeléveis. Eles foram utilizados, inclusive, como mateiros na repressão à Guerrilha do Araguaia.
        - O fator Dan Mitrione – A comprovação cabal do ensino de técnicas de tortura nos cursos de formação de policiais e soldados. O fato de a GRIN ter sido treinada e coordenada pela Polícia Militar de Minas Gerais não é mero acaso. Nos anos 1960 tinha domicílio em Belo Horizonte o agente do FBI/CIA Dan Mitrione. Era tão respeitado aqui, que deu nome a uma rua  no Bairro das Indústrias. Em 1983, graças a projeto dos então vereadores Helena Greco e Arthur Vianna – juntamente com movimentos sociais - esta rua passou a chamar José Carlos da Matta Machado - estudante de direito mineiro, militante da Ação Popular Marxista Leninista (APML), assassinado sob tortura pela ditadura militar em 1973. Na década de 1960, Dan Mitrione estava a serviço da USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional). Sua função precípua era ensinar como reprimir eficazmente, com concentração em técnicas de tortura, que ele considerava uma ciência. A PMMG foi treinada por ele. Suas cobaias eram mendigos, presos ditos comuns e presos políticos. Atuou também no Rio e em São Paulo. No final dos anos 1960 o maestro de la tortura, como passou a ser chamado, foi para o Uruguai onde teve o fim merecido: foi capturado e justiçado pelos Tupamaros, em 1970. Ele é retratado na personagem de Yves Montand do filme Estado de sítio de Costa – Gavras (1972). Há uma cena que o mostra dando aula prática de tortura, com uma enorme bandeira do Brasil ao fundo. O filme evidentemente foi censurado no Brasil da ditadura.
        Voltando ao Arara: os militares que ministraram o intensivão de três meses para a turma da GRIN  são multiplicadores dos ensinamentos do maestro de la tortura. Trata-se de projeto institucionalizado, com cadeia de comando e anuência dos governos estadual e federal. Resta nomeá-los e responsabilizá-los todos: quem ministrou, quem ordenou, quem permitiu. O governador Israel Pinheiro, seu secretário de educação (???) José Maria Alkmin (tio-avô de Geraldo Alkmin/PSDB), o cap. PM Manuel Pinheiro, o ten. cel. Costa Cavalcanti (signatário do AI-5) são algumas as autoridades que se mostravam esfuziantes no desfile de  formatura da GRIN. A militarização da questão indígena foi levada ao paroxismo em todo o país, com destaque para Minas Gerais.
        O relatório final da CNV apresenta exíguas 35 páginas sobre a questão indígena, que segue sendo tratada como tabu. Os documentos revelados não foram incorporados ao texto. Não se abriu linha alguma de investigação apesar da prodigalidade de provas e evidências. Estas 35 páginas quase não passam de um lacônico “há mortos e feridos”, como observa Marcelo Zelic.
        O quadro atual continua devastador, como sabemos: o governo golpista Michel Temer (MDB/PSDB/Progressistas e outros) tem exacerbado a iniquidade. Seu ministro da agricultura é ninguém menos que o latifundiário, dito rei da soja, Blairo Maggi (Progressistas). Aprofunda-se a militarização de todas as instâncias do governo, inclusive da FUNAI. Osmar Serraglio (Progressistas) – que foi também Ministro da Justiça e Segurança Pública deste governo espúrio - é o relator da PEC 215/2000 cujo objetivo é garantir ao legislativo, dominado pelas bancadas Boi/Bala/Bíblia/Jaula, a prerrogativa de decidir sobre a demarcação de terras indígenas e quilombolas, ou seja, absolutizar a espoliação. Há também a questão do marco temporal, dispositivo fabricado para promover o esbulho total das terras indígenas ancestrais, os tekohas – para os Povos Originários o lugar onde se é, sem o qual/longe do qual não há vida possível. Existem hoje pelo menos 189 iniciativas no congresso contra os direitos dos Povos Indígenas. Somos ainda submetidas/os às mais infames declarações racistas, de Bolsonaro (PSL), do gen. Hamilton Mourão, seu vice, e demais sequazes – neoconservadores/fascistas entusiastas da ditadura, fãs do torturador-mor Brilhante Ustra, inimigos das lutas da classe trabalhadora, inimigos do Povo Negro e dos Povos Indígenas, dos movimentos feministas e LGBTQIs, inimigos da cultura e da diversidade. Há ainda processo de destruição igualmente criminoso da história, dos saberes, línguas e conhecimentos dos Povos Indígenas. São tão ameaçados de extinção quanto a sobrevivência física deles: trata-se de etnocídio e epistemicídio sistêmicos.
        Felizmente, no entanto, a dialética joga a nosso favor: se são mais de 500 anos de opressão, são também mais de 500 anos de resistência. A batalha é árdua, contínua, diária, sangrenta – é assim que a permanente mobilização dos Povos Indígenas tem combatido os diversos ataques sofridos ao longo de mais de cinco séculos.
 3) SERRA VERDE (Luciene Araújo)
        Em setembro de 2012, após décadas trancafiados, 165 homens e mulheres começam a deixar o último hospício da grande BH, a Clínica Serra Verde (Vespasiano/MG). Desfaçatez dupla da direção do hospício: chamar campo de concentração de clínica e responsabilizar os baixos valores que seriam repassados pelo SUS pela degradação de tal masmorra.
       Tema relevante sobretudo agora quando assistimos a processo galopante de remanicomialização perpetrado pelo Ministério da Saúde, quase sempre na calada da noite. O projeto do governo federal é o resgate de hospícios e o reforço das comunidades terapêuticas, os quais estão na centralidade do financiamento público.
        Higienismo/eugenismo/estereotipismo/periculosidade e loucura para criminalizar, estigmatizar, controlar e confinar as eternas classes perigosas, classes torturáveis: estas últimas novidades do século XIX (Cesare Lombroso, Gobineau et caterva) constituem o paradigma da política para a saúde mental do governo federal.  Leia-se: legitimação do confinamento e controle das/os não-hegemônicas/os.
        O espectro dos manicômios nos ronda e vem acompanhado dos cifrões públicos – denuncia a Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (RENILA). Lembremos que data de 1990 a implementação dos primeiros serviços substitutivos, conquista da luta pela Reforma Psiquiátrica Antimanicomial.
        O desmonte das leis antimanicomiais (Lei 11 802/ 1995 e Lei 10 216/2001), da política de redução de danos e das políticas públicas constitui mais uma ofensiva reacionária e demofóbica do governo Temer. Trata-se de tentativa de aniquilar projetos construídos pela combatividade das/os usuárias/os e das/os trabalhadoras/es em saúde mental ao longo de 40 anos
        Franco Basaglia, a grande referência da luta antimanicomial, esteve em Belo Horizonte em 1978-1979. Ele escancarou para o Brasil e para o mundo a denúncia do campo de concentração/casa de torturas de Barbacena reforçando a luta iniciada pelos trabalhadores em saúde mental. Segundo ele, não se humanizam instituições totais - elas precisam ser destruídas: deve ser permanente a nossa “luta contra a violência e a exclusão, que estão na base de todas as relações em nossa sociedade”. É emblemática a sua sustentação da necessidade da luta pela desinstitucionalização em todas as esferas ao afirmar que o que caracteriza as instituições é a nítida divisão entre os que têm poder e os que não têm” – é a “relação de opressão e violência entre poder e não poder” que tem que ser permanentemente desconstruída.
4) VÍDEO-CARTA (Priscila Musa)
        Belo documentário que funciona como coda dos filmes desta mostra, por isto o deixamos para o final: aborda todos os temas colocados anteriormente. Coda significa seção conclusiva de uma composição musical/arremate. Usamos o termo musical porque foi esta a sensação que o filme nos passou.
       Vejamos, então, fragmentos do seu conteúdo, por ordem de entrada:
- Operação Condor / terrorismo de Estado / Internacional da repressão: Brasil-Uruguai (onde Dan Mitrione foi justiçado pelos Tupamaros em 1970)- Argentina / Escola de Mecânica da Armada (ESMA) / Rio da Prata (mortalha de milhares dos 30 mil desaparecidos políticos argentinos).
- Os lugares de memória e direitos humanos no Uruguai e na Argentina.
- 2013 - Casarão da Rua Manaus, Santa Efigênia-BH (Ocupação Espaço Comum Luíz Estrela) – Evocação das belas jornadas de julho/2013, o Casarão é também lugar de memória ressignificado sem perda da sua dimensão trágica. Trata-se do Complexo arquitetônico da Psiquiatria da Infância e Adolescência da Fundação Hospitalar de Minas Gerais. Instituição total cercada por instituições totais: Batalhão da PM (centro de tortura durante a ditadura), hospital militar, Igreja: o entorno constitui um cadinho do aparato repressivo e do aparato ideológico do Estado. Os grafismos das crianças internadas ficam a denunciar a arquitetura do claustro e do horror. 
- Vício de origem de BH: cidade planejada sob o signo da eugenia, do higienismo, da quadriculação, da opressão, do controle pan-óptico.
- A perfeita concepção de memória dos Povos Indígenas: não o que se guarda, mas o que se transmite – é preciso contar a história. Não podemos perder a batalha da construção da narrativa contra hegemônica. Precisamos tecer permanentemente a contra memória e o contra discurso.
- A bela homenagem às Madres de Plaza de Mayo / La Ronda de Las Madres: nas suas consignas, a luta contra o terrorismo de Estado se soma à luta contra o terrorismo do capital num tributo a seus entes queridos mortos e desaparecidos pela ditadura argentina (1976-1983):
O CAPITALISMO FINANCEIRO É TERRORISTA!
        Desfecho de Vídeo-Carta: possibilidade de evasão da opressão/ passagem/resgate - o respiradouro penosamente aberto no Casarão da Rua Manaus remete à passagem no muro do hospício usada para comunicação com o exterior/com a vida, mostrada por Valéria em Serra Verde.
        A título de conclusão:
    Cidade em Movimento / Cidade e Memória / Memória em Movimento: valem todas as variações. Resgatar a Cidade enquanto memória organizada da sociedade demanda o exercício permanente da perplexidade, da indignação, da negação resoluta. Demanda luta contínua contra a estratégia do esquecimento. Não queremos a cidade construída pelo inimigo a que se refere Jacques Rancière (citação final do Vídeo-Carta). Queremos aquela Cidade prevista por Carlos Drummond de Andrade: uma cidade sem portas, de casa sem armadilhas (...) uma terra sem bandeiras, sem igrejas nem quartéis (...) um jeito só de viver, mas nesse jeito a variedade, a multiplicidade toda que há dentro de cada um...
      Nestes tempos sombrios, vamos concluir com um trecho da Carta a um poeta suicida, poema de Maiakovski (também ele suicida):
Por enquanto há escória de sobra.
O tempo é curto, mãos a obra.
É preciso transformar a vida
Para cantá-la em seguida.
PELO FIM DO GENOCÍDIO DOS POVOS ORIGINÁRIOS!
PELO DESMANTELAMENTO DO APARATO REPRESSIVO!
POR UMA SOCIEDADE SEM PRISÕES E SEM MANICÔMIOS!
10 de setembro de 2018
Instituto Helena Greco de direitos Humanos e Cidadania 

LEIA TAMBÉM:

CIDADE E MEMÓRIA - DOCUMENTÁRIOS SOBRE A DITADURA E A LUTA ANTIMANICOMIAL

sexta-feira, 31 de agosto de 2018

ABAIXO HUGO STUDART E SEU LIVRO REACIONÁRIO!

MENSAGEM DE SOLIDARIEDADE INCONDICIONAL AOS FAMILIARES DE MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS E AOS GUERRILHEIROS DO ARAGUAIA! 
        O Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania reitera total solidariedade e apoio incondicional aos familiares de mortos e desaparecidos. Repudiamos fortemente as sórdidas e infames invectivas deste tal Hugo Studart contra as companheiras Crimeia Alice Schimdt de Almeida (Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos) e Elizabeth Silveira (Grupo Tortura Nunca Mais/RJ) – referências nacionais e internacionais da luta pelo direito à História, à Memória, à Verdade e à Justiça. O objetivo deste senhor, sabemos, é o esbulho desta luta e a legitimação da ditadura militar. Trata-se de afronta à luta dos familiares de mortos e desaparecidos. Mais do que isto, trata-se de agressão absolutamente insuportável às companheiras e companheiros que tombaram na luta.
        Repudiamos igualmente a Universidade de Brasília (UnB) que deu respaldo a esta iniquidade travestida de tese de doutorado (???). Sinal destes tempos sombrios de fascistização da sociedade: obscurantismo acadêmico, desconfiguração/deterioração da pesquisa, aniquilamento da construção do conhecimento e primazia da mentira organizada. Tese que virou livro reacionário que está sendo repudiado e escrachado pelos movimentos sociais.
Belo Horizonte, 31 de agosto de 2018
Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania – Belo Horizonte/MG 

- Leia também: 
- NOTA DE SOLIDARIEDADE AOS FAMILIARES DOS DESAPARECIDOS DA GUERRILHA DO ARAGUAIA (Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos)
- NOTA DENÚNCIA E CONVITE PARA O ESCRACHO (Grupo Tortura Nunca Mais/RJ) 

segunda-feira, 27 de agosto de 2018

CIDADE E MEMÓRIA - DOCUMENTÁRIOS SOBRE A DITADURA E A LUTA ANTIMANICOMIAL

Imagem: Documentários VÍDEO-CARTA, SERRA VERDE, MEMÓRIA ESSENCIAL e ARARA: UM FILME SOBRE UM FILME SOBREVIVENTE. 


 12ª CINEBH - Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte
Mostra “A cidade em Movimento”

Sessão 2 - "CIDADE E MEMÓRIA" :

Quinta-feira, dia 30/08/2018, às 19h00
- Cine Sesc Palladium - Sala Prof. José Tavares de Barros - BH/MG

Exibição dos documentários:
VÍDEO - CARTA
SERRA VERDE
MEMÓRIA ESSENCIAL
ARARA: UM FILME SOBRE UM FILME SOBREVIVENTE

*Ao final da sessão haverá uma roda de conversa com a presença dos diretores dos filmes. Convidada para roda de conversa: Heloisa Greco (Bizoca) - membro do Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania – BH/MG.

        "Cidade e Memória traz filmes produzidos por novos cineastas de Belo Horizonte sobre fatos históricos ocorridos no Brasil e América Latina, além de filmes que trazem marcas que a nossa cidade ainda carrega sobre os tempos da ditadura e das instituições manicomiais. Contra a ditadura e contra os manicômios, contra tudo que aprisiona e cerceia o livre direito de ir e vir, a sessão é uma resposta da cidade para os tempos sombrios que estamos vivendo”.

        A programação é oferecida gratuitamente ao público. Os ingressos deverão ser retirados na bilheteria de cada espaço, 30 minutos antes do horário de cada sessão. Classificação: 12 anos.

VÍDEO - CARTA | DIREÇÃO: PRISCILA MUSA - DOCUMENTÁRIO, COLORIDO, DIGITAL, 20 MIN, 2018

Sinopse

        Uma pequena carta por onde percorremos alguns fragmentos de imagens. Os rastros dos tempos de escuridão tatuados no espaço urbano de Buenos Aires, de Montevidéu e de Belo Horizonte. A ditadura civilmilitar, o Parque da Memória e a Praça de Maio na Argentina. Os anos de fuzilamento e tortura do Cárcere Miguelete, atual Espaço de Arte Contemporânea no Uruguai. Alguns pequenos frames de luz colocam o passado em movimento no presente, para que possamos pensar sobre a memória de um antigo Hospital de Neuropsiquiatria Infantil, o casarão que hoje abriga o Espaço Comum Luiz Estrela. Ao mesmo tempo, um cavalo que se recusa a viver na cidade flutua na imagem, como uma de nossas memórias visuais mais antigas.

SERRA VERDE | DIREÇÃO: LUCIENE ARAUJO - DOCUMENTÁRIO, COLORIDO, DIGITAL, 17 MIN, 2018

Sinopse:

        As "ruínas" de um manicômio desativado são percorridas e dois personagens relatam experiências traumáticas e inusitadas sobre esse local, a "Clínica Serra Verde", situada em Vespasiano, região metropolitana de Belo Horizonte. O espectador é impulsionado a entrar imageticamente no interior da clínica. A atmosfera do documentário Serra Verde relaciona-se com a história do espaço onde lembranças e memórias foram marcadas pelo encarceramento de muitas pessoas.

MEMÓRIA ESSENCIAL | DIREÇÃO: LUCIENE ARAUJO E CERES CANEDO - DOCUMENTÁRIO, COLORIDO, DIGITAL, 6 MIN, 2016

Sinopse:

        Documentário híbrido baseado em registros documentais e relatos de dois familiares mineiros de desaparecidos na Guerrilha do Araguaia. É também um ensaio que percorre a poética das imagens construídas pela memória daqueles que sofreram mais cruelmente as consequências da ditadura militar no Brasil (1964-1985). No curta, Maria de Fátima Marques e Valéria Costa Couto narram as trajetórias de seus irmãos e as dores provocadas pelo desaparecimento forçado de um familiar. Expõem a oscilação entre o querer lembrar e o querer esquecer essa história sem fim. Essa "morte incerta" do individuo ausente. Essa história silenciada.

ARARA: UM FILME SOBRE UM FILME SOBREVIVENTE | DIREÇÃO: LIPE CANÊDO - DOCUMENTÁRIO, COLORIDO, DCP, 13 MIN, 2017

Sinopse:

        Em 2012, Rodrigo Piquet, do Museu do Índio, mostra a Marcelo Zelic, do grupo Tortura Nunca Mais, um filme que encontrara, chamado Arara. O título não se referia ao animal, nem ao povo conhecido por esse nome. Zelic o aponta como importante registro probatório sobre o ensino de tortura durante a ditadura militar. Eram imagens da formatura da Guarda Rural Indígena, em Belo Horizonte, produzidas pelo indigenista Jesco Von Puttkamer em 1970.

* Informações e programação completa da mostra “A cidade em Movimento” - 12ª CINEBH:
 
http://cinebh.com.br/


https://www.facebook.com/cinebh/



https://www.facebook.com/cinebh/videos/313374196077518/


* LEIA TAMBÉM SOBRE O DOCUMENTÁRIO MEMÓRIA ESSENCIAL:

- EXIBIÇÃO "MEMÓRIA ESSENCIAL" - 22/07/2015


EXIBIÇÃO DO DOCUMENTÁRIO "MEMÓRIA ESSENCIAL"

REALIZADA A EXIBIÇÃO DO DOCUMENTÁRIO MEMÓRIA ESSENCIAL - 04/09/2013 
https://institutohelenagreco.blogspot.com/2013/09/realizada-exibicao-do-documentario.html

DOCUMENTÁRIO MEMÓRIA ESSENCIAL - EXIBIÇÃO E DEBATE COM OS MOVIMENTOS SOCIAIS SOBRE A GUERRILHA DO ARAGUAIA E DITADURA MILITAR 
https://institutohelenagreco.blogspot.com/2013/09/documentario-memoria-essencial-exibicao.html

terça-feira, 21 de agosto de 2018

SEMINÁRIO NA E.E. MACHADO DE ASSIS EM VESPASIANO

NOTÍCIA SOBRE O II SEMINÁRIO EDUCAÇÃO E LUTA DE CLASSES
        Realizado no sábado, dia 11/08/2018, o II Seminário Educação e Luta de Classes - Novas estratégias de lutas dos trabalhadores em educação e pela construção da greve de ocupação. Construir a greve de ocupação unindo professores, estudantes, pais, funcionários e toda a comunidade em defesa da escola pública!
        O seminário aconteceu na Escola Estadual Machado de Assis em Vespasiano/MG. Foi organizado pelo Comando de Luta Classista dos Trabalhadores em Educação e pelo Sind-Ute – Subsede Vespasiano/São José da Lapa – MG.
        A programação começou pela manhã com a exibição do documentário Acabou a paz, isto aqui vai virar o Chile - Escolas ocupadas em São Paulo (60’ – 2016) de Carlos Pronzato. “A saga dos estudantes secundaristas de São Paulo por uma educação de qualidade. O levante do segundo semestre de 2015 contra o fechamento de 94 escolas culminou na ocupação de mais de 200 que seriam afetadas pelas ações de precarização do ensino público engendradas pelo Governo de Geraldo Alckmin, o qual vem perdendo apoio dia após dia. A coragem, a autonomia, a horizontalidade, a solidariedade demonstradas pelos secundaristas e o apoio popular presentes! Os gritos seguem ecoando na rua talvez anunciando uma profecia já concretizada: Acabou a paz, isto aqui vai virar o Chile!”
        Na parte da tarde houve duas mesas de palestras. Os debates contaram com a participação de estudantes, professoras/es e militantes de movimentos sociais:
- Análise de conjuntura nacional e internacional – com a professora Heloisa Greco “Bizoca” (Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania) e Eduardo Magrão (operário da construção civil e membro da Liga Operária). A mediação foi feita pelo professor Kleiton Gomes (Comando de Luta Classista dos Trabalhadores em Educação).
- Estratégias de lutas dos trabalhadores em educação e a necessidade da construção da greve de ocupação – com o professor Rômulo (Moclate – Movimento Classista dos Trabalhadores em Educação) e Rosa (estudante que participou de ocupação de escola em São Paulo, em 2015). A mediação foi feita pelo professor João Martinho (Sind-Ute – Subsede Vespasiano/São José da Lapa – MG).
        Durante os intervalos e no encerramento houve forte apresentação do grupo de protesto Ameaça Vermelha – “O grupo de Rap ‘Ameaça Vermelha’ surgiu em 2015 na Zona Leste de São Paulo (SP) com o intuito de levar às massas mais empobrecidas a Cultura Popular, mantemos desde o começo uma linha revolucionária nas letras buscando sempre propagandear a Revolução de Nova Democracia em nosso país, como único caminho para a libertação do povo e para varrer o imperialismo da face da terra. Em síntese o ‘Ameaça Vermelha’ é um grupo de caráter Antifascista, Anti-imperialista e Revolucionário”. “Que as classes dominantes tremam diante da Cultura Popular!”
        O seminário foi dedicado às combativas professoras que faleceram neste ano.
Companheira Viviane Ciriaco (02/03/1971 – 17/02/2018):
Presente na luta!
Companheira Jussara Maria Gomes (26/11/1971 – 19/07/2018):
Presente na luta!
Agradecemos a todas e todos pelo convite e pela presença!
Belo Horizonte, 21 de agosto de 2018
Notícia/Fotos: Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania
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Abaixo reproduzimos o texto distribuído pelos organizadores e debatido durante o seminário:
        “II Seminário Educação e Luta de Classes
Construir a greve de ocupação unindo professores, estudantes, pais, funcionários e toda a comunidade em defesa da escola pública!
        Estamos realizando o nosso segundo seminário Educação e Luta de Classes com o objetivo de avançar em nossa organização e luta em um momento de grave crise do capitalismo burocrático em nosso país, como parte da crise geral do sistema imperialista[1]. Como inevitável consequência dessa crise nossas escolas estão sendo cada vez mais atacadas e sucateadas, os trabalhadores em educação estão vendo seus direitos arrancados, os seus salários arrochados e atrasados e os estudantes cada vez mais prejudicados em seu direito de estudar e aprender.
        Viemos de importantes lutas, como a greve na rede estadual que durou 42 dias entre março e abril de 2018, em que nosso Comando de Luta Classista dos Trabalhadores em Educação impôs a marca da combatividade, contrapondo à greve imobilista e de pijama da cúpula estadual do sindicato. Ao final da greve, realizamos um importante seminário em que estudamos o significado do pensamento do grande Karl Marx, como parte das celebrações dos seus 200 anos e iniciamos, ainda que brevemente, um balanço desta greve de 42 dias.
        Neste balanço apontamos que mesmo com as vitórias da greve para nossa organização, era necessário entender as limitações das greves tradicionais e avançar na tática da greve de ocupação para avançarmos na nossa organização para a conquista de nossos direitos. Atuamos organizados enquanto Comando Classista dos Trabalhadores em Educação no Congresso do SIND-UTE/MG, apresentando nossa tese de greve de ocupação contra as demais teses oportunistas e eleitoreiras e saímos fortalecidos com a convicção de que a greve de ocupação é o caminho que devemos traçar: mesmo sem dominar toras suas particularidades na prática. Por isso, é que temos de nos aprofundar para buscar responder: O que é a greve de ocupação? Quais experiências existem na história recente em nosso país? E como podemos aplicá-la em nossas escolas?
        Para aprofundarmos nestes questionamentos, selecionamos alguns trechos do balanço da greve de 2011 feita pelo MOCLATE – Movimento Classista dos Trabalhadores em Educação, que corresponde ao balanço que devemos fazer da greve deste ano e principalmente a necessidade de buscarmos novas formas de lutas, junto aos trabalhadores em educação:
“Em todo o país somos 1,5 milhão de professores da educação básica pública trabalhando em 160 mil escolas com 45 milhões de alunos (dados de 2009). Somos uma parcela importante dos trabalhadores do país e, apesar de desempenhar uma atividade intelectual, somos parte do proletariado brasileiro. No final dos anos de 1970, a mobilização política dos professores foi fundamental para pôr abaixo o regime militar. Mas desde este período o movimento de professores tem sido hegemonizado pela CUT a serviço do oportunismo eleitoreiro do PT. O projeto de eleger Lula presidente converteu greves na educação em instrumento e joguete de mero desgaste eleitoral de governantes adversários. Ou, ao contrário, gerou vacilação e conciliação quando o governante era aliado, como durante o gerenciamento de Itamar Franco em Minas.
        Parcelas importantes do professorado passaram a ver com desconfiança as greves e manifestações devido à manipulação descarada exercida pela direção das entidades. Assim, a deterioração das condições de trabalho do magistério e o sucateamento nunca visto da escola pública dos últimos tempos não encontraram no movimento de professores a resistência necessária.
Mas o agravamento da crise está impulsionando a retomada da luta. O surgimento de correntes classistas, como o MOCLATE — Movimento Classista de Trabalhadores em Educação (da Liga Operária) — antecipam novas perspectivas para a luta do magistério. Não temos ilusões que neste Estado seja possível transformar no necessário as condições das escolas públicas ou de nossos salários. Estamos convictos que estes governos, em todos seus níveis, não têm compromisso com os interesses do povo. E muito ao contrário, cumprem o papel de submeter tudo aos interesses dos lucros das classes dominantes. O que temos tirado como lição, entretanto, inclusive da recente greve em Minas, é que podemos ter saltos de organização e de politização dos professores.
        Ganhou terreno o classismo, a combatividade na luta por direitos, a democracia no movimento. Ficou claro que sem combatividade não é possível pressionar o governo. Estas greves por muito extensas que sejam, afetam minimamente o governo. Não são como uma paralisação numa indústria ou no transporte público que trazem grande impacto econômico. Ao contrário, são facilmente utilizadas pela manipulação demagógica dos governantes e usada como chantagem por essa imprensa venal, os quais se apresentam como hipotéticos defensores do direito do povo à educação. Por isto defendemos que devemos repensar e avançar em nossas formas de luta. É preciso e necessário ultrapassar os limites que esta ordem reacionária nos impõe defendendo e praticando o direito do povo à rebelião, de que a Rebelião se Justifica!
OCUPAR TODAS AS ESCOLAS
        Precisamos potencializar nossas greves com a ocupação da administração e de todas as atividades da escola, transformando cada uma delas na nossa base principal de organização. Para isto ela tem que ser um ponto de mobilização e organização de professores, funcionários, estudantes e pais, enfim uma Assembleia Popular na defesa da escola pública. E não somente nos momentos de luta por melhores salários e condições de trabalho. Manter a escola fechada durante nossas greves nos enfraquece, pois nos distancia do que deve ser nosso principal apoio, enquanto os agentes do Estado reacionário e a imprensa dos monopólios trabalham para desinformar e confundir a população. Ocupando as escolas para dar aulas às crianças e jovens e realizar assembleias com a comunidade, explicando e informando a todos a real situação do ensino e dos trabalhadores (professores e outros servidores), a situação do país, a politicagem oportunista dos “políticos” e de seus partidos eleitoreiros demagógicos e mentirosos, realizando enfim toda a denúncia sobre este Estado e seu caráter de classe opressor e explorador do povo trabalhador; desmascarar todos seus gerentes (municipal, estadual e federal  e toda sua estrutura executiva, legislativa e judiciária) que enganam as massas, violam seus direitos mais elementares para defenderem os interesses das classes serviçais do imperialismo. Nossas manifestações, ocupações de prédios públicos têm que ser organizadas a partir das escolas, envolvendo boa parte da população que são os pais de alunos. Cada escola pública, uma a uma, deve ser o centro de nossa organização, construindo vigorosas e massivas Assembleias Populares de base. O caos que hoje se instalou nas escolas públicas é porque elas têm se transformado em uma extensão do aparato repressivo sobre nossa juventude. Ver na rebeldia de nossos jovens principalmente expressão de delinquência ou de uso de drogas é não levar em conta a violência que hoje se abate sobre eles por várias formas e vias, e a negação completa de seus direitos. Educar é transformar. Atrevamo-nos a revolucionar nossas escolas. É preciso não só entender nossos estudantes, mas infundir neles a confiança e esperança de que podemos, com nossa luta, com nossa mobilização, organização e politização transformar o Brasil e o mundo.
Em essência, como professores, devemos imprimir em nosso trabalho um profundo e verdadeiro sentido de servir ao povo de todo o coração. Ganhar o coração das massas populares ajudando na elevação, insistimos, de sua mobilização, politização e organização. Só assim faremos de nossas escolas trincheiras para as transformações tão reclamadas em nosso país.” 
        Fazemos questão de reproduzir esta importante avaliação do MOCLATE porque ela se mostrou completamente acertada, como demonstraram as lutas estudantis nas escolas públicas nos anos seguintes.
Juventude combatente toma as ruas, universidades e escolas
        No mesmo período da greve dos trabalhadores em educação de Minas Gerais em 2011, no outro extremo do país, os estudantes da UNIR – Universidade Federal de Rondônia, por meio de uma combativa greve unificada junto aos professores e servidores, apontavam o caminho mais consequente para a luta em defesa do ensino público. Os estudantes da UNIR, que lutavam contra o sucateamento, as ameaças de fechamento da universidade e pela deposição do reitor Januário Amaral, envolvido em inúmeros esquemas de corrupção, ocuparam  a reitoria da universidade por mais de dois meses e angariaram o apoio massivo da população de Porto Velho e cidades próximas à capital. Devido ao massivo envolvimento de toda a comunidade acadêmica, a universidade não ficou fechada, ao contrário, tornou-se palco de grandes eventos políticos e culturais que tinham como centro chamar a atenção da opinião pública para a situação caótica do ensino e convocar a população a apoiar a luta em defesa da UNIR. Por mais que a burocracia universitária tentasse deslegitimar a greve, utilizando o monopólio de imprensa para criminalizá-la como “baderna”, “vandalismo”, etc., ficava cada vez mais evidente para a população local a justeza da greve e a necessidade da própria ocupação. Da mesma forma, o uso da força repressiva do Estado, por meio da atuação da Polícia Federal que chegou a prender um professor e dois estudantes grevistas e mesmo ameaças de morte contra ativistas, não fizeram o movimento retroceder. A justeza da linha encetada pelos estudantes ficou comprovada na conquista de todas as reivindicações e na deposição do reitor Januário Amaral, conquista sem precedentes na historia do movimento estudantil brasileiro.
        Já em 2014, no influxo das grandes jornadas de junho/julho de 2013 e em meio à luta contra a farra da Fifa, os estudantes de Goiânia ocuparam as escolas contra a tentativa do governo de Goiais de avançar nos intentos de privatização do ensino público com as chamadas Organizações Sociais (OSs) e com essa tática derrotaram essa investida contra o ensino público. Também nesse momento a juventude combatente levantou-se, na capital paulista, contra as medidas de fechamento de escolas impostas pelo gerenciamento de Alckmin/PSDB. Os estudantes ocuparam as escolas com o apoio dos pais e, em muitos locais, os professores se juntaram à luta. Reforçando a justeza da linha de ocupação das escolas, os estudantes se organizaram em comissões (alimentação, limpeza, disciplina, cultural e autodefesa) assegurando o funcionamento das escolas e realizando atividades junto às comunidades onde as escolas estavam localizadas. Mantiveram, assim, por meio do apoio popular, as ocupações, apesar da grande repressão policial e das tentativas da imprensa em deslegitimar o movimento por meio do berreiro histérico de “vandalismo”. Nestas lutas os oportunistas da UNE/UBES, que já estavam queimados pela experiência das jornadas de 2013 e todo o seu histórico de traição à luta estudantil, correram para se cacifarem com a mobilização das massas, mas foram, literalmente, expulsos pelos estudantes da maior parte das escolas ocupadas.
        Na medida em que o gerenciamento de Alckmin aumentava a repressão contra os estudantes, as ocupações se expandiam na capital e espalhavam-se para outras cidades do estado. Desta forma os estudantes venceram tal contenda, impedindo o fechamento das escolas. O exemplo da juventude combatente entusiasmou professores e pais em todas as partes do país. Paralisações, greves e ocupações ocorreram em solidariedade aos estudantes paulistas. Novamente, em 2016, para desespero da reação e do oportunismo, as ocupações de escolas por estudantes voltaram a se generalizar na luta contra a PEC 55 e a contrarreforma do ensino médio. No Paraná, a luta dos estudantes ganha contornos e dimensões semelhantes ao grande movimento dos secundaristas em São Paulo em 2014 e 2015. Foi a partir deste momento que as ocupações, que já vinham sendo utilizadas como método de luta pelos estudantes brasileiros nas universidades públicas, por meio da ocupação de reitorias desde a luta contra a “reforma” universitária do Banco Mundial durante o gerenciamento do oportunismo, passaram a ser o principal método de luta do movimento estudantil combativo. Da mesma forma como a utilização de barricadas com fogo e a cobertura dos rostos generalizaram-se depois de 2013.
        Em Belo Horizonte e região metropolitana, embora não tenha ocorrido nas mesmas dimensões que em São Paulo e Paraná, aconteceram ocupações importantes em várias escolas, demonstrando a adesão dos estudantes a esta forma de luta. Isto também ocorreu por todas as partes do país. Em 2016, vários países tiveram escolas e universidades ocupadas pelos estudantes, na luta pela escola pública.
Ocupar todas as escolas junto aos estudantes e comunidades escolares!
        Todas estas experiências comprovam que a ocupação das escolas é o único caminho para efetivamente democratizar a escola. Nas ocupações que aconteceram por todo o país os estudantes demonstraram que essa democracia é muito maior que a simples eleição de diretores. Os estudantes se puseram a participar das decisões e em assembleias permanentes se posicionavam, junto a toda a comunidade escolar, sobre todas as questões da escola.
        Devemos, durante todo o período de paralisações, greves e mobilizações manter as escolas abertas e lutar por organizar e manter o funcionamento permanente de Assembleias Populares compostas por profissionais em educação, estudantes e comunidades. Entre estas assembleias, que devem ter caráter soberano na decisão de todos os assuntos concernentes à escola, devemos montar comandos de luta unificados e paritários entre estes três seguimentos, eleitos por maioria simples nas assembleias, de caráter executivo e revogável a qualquer momento. Desta maneira nossa luta se tornará cada vez mais forte. Nossa combatividade se sustentará em uma base muito maior e poderemos, de forma coordenada, realizar manifestações por toda a cidade.
        Ao estalar uma greve devemos nos reunir com os professores e debater a necessidade de organizar a luta a partir de cada escola. Devemos imediatamente direcionar um comunicado de cada escola aos pais e à comunidade circundante explicando nosso movimento e convocando todos para participar de nossas atividades e assembleias. Também é exigido que nos apoiemos sobre as organizações dos estudantes e chamemos assembleias estudantis para que esses possam se posicionar e participar conscientemente de nossa jornada. Assim uniremos toda a comunidade escolar e criaremos as bases para nos ligarmos às massas da cidade e do campo de nosso país na luta pela construção de uma nova sociedade.
        Nossas reivindicações mais imediatas devem ser apresentadas de forma clara nessas lutas e somadas às demais reivindicações dos estudantes e da comunidade escolar. Nos momentos de refluxo da luta, quando as escolas não estiverem mobilizadas e a vida escolar transcorrer de forma “normal”, devemos lutar por envolver todos os principais ativistas (professores, funcionários, estudantes, pais, etc.) organizados na forma de Grupos de Base. Esta é uma questão chave para que o movimento grevista não seja um fim em si mesmo, rompendo com o economicismo e o eleitoralismo do velho movimento sindical oportunista e eleitoreiro das centrais sindicais, que usam as lutas da categoria, como trampolim eleitoral. Estes Grupos de Base se revestirão de formas distintas em cada local. Os Grupos de Base devem ter três funções bem definidas: a primeira é a mobilização permanente dos trabalhadores em educação, dos estudantes e pais em torno dos problemas e atividades da escola e da comunidade; a segunda é a politização das atividades de modo a elevar a consciência classista e combativa de todos os seus membros e a terceira, que também é imprescindível, é a organização democrática de todas as atividades de modo que a luta econômica diária se transforme em um instrumento de organização e propaganda por uma sociedade mais justa e igualitária.
        Para isso devemos apoiar a luta dos estudantes pela sua livre organização, assim como pela criação e manutenção dos grêmios estudantis. E, na medida do possível e segundo as necessidades concretas da luta pela democratização da escola e por reivindicações econômicas específicas, participar dos Conselhos Escolares, assim como apoiar a criação e manutenção das Associações de Pais.
        A experiência histórica demonstra que o elemento mais dinâmico da luta em defesa da democratização das escolas são os estudantes e devemos levar em conta os seus interesses para nos unirmos solidamente com eles. Dentre suas demandas específicas, é necessário dar atenção especial ao lazer, esporte e cultura. Esses são direitos sistematicamente negados às crianças e aos jovens pobres, que temos o dever de lutar por assegurar durante e após as ocupações. Atividades como música, teatro, artes plásticas, jogos, brincadeiras, gincanas, concursos, campeonatos esportivos, festivais, etc., são uma necessidade premente para nos ligar profundamente à juventude combatente e às crianças.
        Como parte de nossos esforços por organizar o movimento classista entre os profissionais em educação, devemos lutar contra a influência do corporativismo e do economicismo (de só ver as reivindicações imediatas da categoria e não das classes populares em seu conjunto) impostos pela hegemonia histórica do oportunismo na categoria e nos unirmos, concretamente, às lutas específicas dos estudantes, em particular, àquelas relacionadas à gratuidade do ensino, como pelo direito a uma alimentação de qualidade nas escolas e o passe-livre estudantil. Dando atenção especial às pautas em que os interesses dos profissionais em educação e dos estudantes convirjam, como as reformulações curriculares (BNCC, etc.); contra a Residência Pedagógica (que se liga à luta dos estudantes universitários pelo direito à extensão e contra a precarização do trabalho docente); Escola sem Partido; contra os cortes de verbas para o ensino público, entre outras políticas e medidas impostas pelos gerenciamentos de turno em todas as esferas.
Companheiras e companheiros,
        Se tomarmos a situação em qualquer escola no estado, encontraremos os trabalhadores em educação altamente descontentes com as medidas dos governos de plantão, com seus salários arrochados e atrasados, falta de recursos e estrutura na escola para garantir o mínimo de apoio didático para as aulas.
        Os trabalhadores em educação, com seus salários atrasados, atrasam o pagamento das contas de suas casas, de aluguel, água, luz, telefone, cartão de crédito. Além disso, muitos se encontram endividados, com créditos consignados, e quando cai a primeira parcela do pagamento, o banco já faz o desconto e muitas vezes esses trabalhadores só veem a cor do dinheiro na segunda parcela que recebem já no final do mês. Isto em uma situação em que muitos professores são “arrimos de família”, pois com o desemprego crescente no país, acaba ficando para esses profissionais a responsabilidade total de famílias inteiras. Os juros das dívidas que os professores têm que pagar não são acrescidos nos salários atrasados, dificultando ainda mais a manutenção de suas casas, faltando, cada vez mais, recursos para itens básicos como alimentação.
        Esta é a situação objetiva sob a qual vai se represando muita revolta. Quando há divisão entre os trabalhadores em educação em entrar em greve no 5º dia útil até receber os salários, e se muitos não querem paralisar suas atividades, na maioria das vezes, é porque desconfiam que esta forma de luta não dará resultado e não confiam na direção estadual do sindicato que está totalmente envolvida em joguetes eleitorais. Enquanto, na rede estadual de ensino, os trabalhadores em educação recebem abaixo do piso salarial nacional, a cúpula da direção estadual do SIND-UTE/MG faz de tudo para blindar o governador Pimentel que é quem no momento tem aplicado essas medidas, inclusive dando declarações de que “a polícia é mais importante para a sociedade que os trabalhadores da educação e da saúde, e por isso devem ter prioridade no pagamento de salários”. O esforço da cúpula da direção estadual do sindicato não é para fortalecer a luta e organização dos professores, mas para fazer vistas grossas ao atraso no pagamento de salários e ensalçando a PEC do piso estadual, transformando isto numa batalha parlamentar para desgastar o PSDB de Anastasia e terem algum fôlego para reelegerem o PT no governo do Estado. Esse joguete eleitoral não interessa à luta dos trabalhadores em educação e às massas populares em nosso país. Seja qual for o governante que vencer as eleições, aplicará as mesmas medidas de arrocho e atraso nos pagamentos de salários e sucateamento das escolas, tendo em vista que ambos fazem parte do Partido Único, que só se divergem no varejo, mas se aliam no atacado, para frear a luta do povo (vide Pimentel/PT e os trabalhadores em educação 2015/2018). Só a nossa organização poderá impedir, através de resistência, os ataques à educação.
        Para aplicar a linha da greve de ocupação, devemos ter em vista que o trabalho político deve ser feito com paciência e persistência. Não devemos ver os trabalhadores em educação como um só bloco, como gente desinteressada e que não quer lutar, mas sim como nossos companheiros de classe. Devemos aprofundar nossa politização, nosso trabalho de propaganda, acumulando no dia a dia para dar saltos em nossa organização. Se agirmos assim, estaremos preparados para dar uma direção mais justa nos momentos em que as lutas mais generalizadas estourarem.
        Vivemos um novo momento da luta de classes em nosso país. Aqui e acolá por todo o país estouram revoltas e rebeliões, cada vez mais frequentes. Mesmo entre os professores tivemos importantes iniciativas, como na greve de 42 dias no início do ano e as paralisações que estão ocorrendo todo o mês em várias escolas do Estado. A firmeza e combatividade da recente greve da educação infantil em Belo Horizonte também nos dá esses sinais. Em Vespasiano, a greve da rede municipal de ensino enlouqueceu a prefeita que teve que enfrentar a direção combativa dos companheiros da direção da subsede do SIND-UTE/MG de Vespasiano e São José da Lapa. Por todo o país os trabalhadores em educação resistem às medidas de ataque à educação. A recente greve dos caminhoneiros que pararam completamente o país por uma semana deu indicações importantes da disposição de nosso povo de lutar e indicou que somente com organização e combatividade podemos impor nossas reivindicações e conquistar nossos direitos. Atrevemo-nos a transformar nossas escolas em trincheiras da luta popular!
Propostas:
1- Realizar seminários por escola, principalmente onde trabalhamos, com o estudo deste documento como forma de reposição.
2- Organizar grupos de base do Comando de Luta Classista dos Trabalhadores em Educação por escola.
3- Apoiar a organização e formação independente dos estudantes e seus grêmios;
4- Desenvolver debates com toda comunidade escolar (Professores, funcionários, estudantes e pais) sobre a defesa da escola pública gratuita e que sirva ao povo;
5- Promover atividades culturais que valorizem a cultura popular;
6- Debater sobre formas de aliar os conteúdos escolares aos temas políticos a serem trabalhados com os estudantes na escola conforme a demanda;
7- Promover debates sobre a farsa eleitoral nas escolas.
Vespasiano, 11 de agosto de 2018
Comando de Luta Classista dos Trabalhadores em Educação”


[1] O Capitalismo burocrático é a forma que o sistema capitalista se desenvolveu nos países atrasados, nos quais a revolução burguesa (Revolução Democrática) ainda não se concretizou, é um capitalismo que fora desenvolvido de fora para dentro pelas potências imperialistas com objetivo de manter seu domínio e aumentar seu saqueio, por isso dizemos que foi engendrado. É caracterizado por se sustentar sobre relações não capitalistas de tipo feudais ou semifeudais de modo a manter o país atrasado economicamente e assim manter a condição de país consumidor dos produtos das potências imperialistas, exportador de matéria-prima (in natura como Commodities – produtos que possuem seu valor determinado pelo sistema financeiro internacional) e subjugado politicamente, por isso estes países são caracterizados como colônias ou semicolônias, dependendo do grau de dominação. Tais formas de dominação se mantêm desenvolvendo com uma aparência de capitalismo contudo mantêm em sua essência os elementos não capitalistas e de dependência (exemplo o agronegócio e as montadoras e automóveis). O atraso nas relações econômicas se reflete em um sistema de governo subserviente, anti-povo e anti-nação, como também em formas culturais alienante e conservadoras, dado que seu objetivo é desenvolver as melhores condições para a inversão de capitais de seus amos imperialistas. Nos países em que se desenvolveu o capitalismo burocrático segue pendente a Revolução Democrática, que não pode mais ser levada a termo pela burguesia, e deve ser compreendida como a primeira tarefa revolucionária a ser levada a cabo pela frente única revolucionária como Revolução Democrática de novo tipo, baseada na aliança operário-camponesa cujo conteúdo é revolução agrária e anti-imperialista, para destruir o latifúndio e desenvolver a industrialização e nacionalização das riquezas nacionais.